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terça-feira, 27 de maio de 2014

Amizade para além do além - amizade eterna.

Para uma pessoa que já morreu, de que vale o nascer do sol todos os dias atrás das colinas? Para quem já morreu, o dia e a noite não fazem mais diferença. Nem o sabor, nem o tocar, nem as palavras, nem as cores, as roupas, as festas, as bebidas, as danças...

Andando pelas ruas, eu paro e contemplo o sol. Sinto o vento fresco no meu rosto, roçando meus cabelos e balançando as flores coloridas, tão diversas... Vejo o pó que se levanta do chão e dança no ar, na música do vento... Ouço a voz das crianças brincando, os carros nas ruas... e louvo ao Senhor pela criação. Todas as coisas foram feitas para nós, por nossa causa. Saibamos aproveitá-las. Quem já morreu não ouve mais nada, nem vê, nem sente. Está do outro lado.

Lembra daquela porta que você tanto queria? Era uma porta suntuosa, própria das lindas mansões. Eu me recordo de quando você a comprou, e de como se orgulhou ao abri-la para que eu entrasse! Pois é. Ela está lá, na fachada da sua casa nova. Mas, e você, está aonde?

Todas as coisas que existem na face da Terra, tanto as criadas por Deus como as invenções humanas, todas servem para apenas uma coisa: polir a nossa alma. Se não servirem para isto, não servem para nada.

Aquela torta maravilhosa que você fazia, se não colocou amor nela, de nada valeu. Aquela música que você adorava ouvir, se não serviu para levá-la à transcendência, foi tempo perdido. Aqueles trabalhos que tanto pesavam para você, se não os ofereceu como sacrifícios... foram em vão.

Aquele passeio maravilhoso que fizemos no parque aquático, no qual você descia pelas águas dos tobogãs numa felicidade sem tamanho, se aquele momento não a levou ao louvor e à ação de graças, então foi apenas mais uma diversão. Veja só como o Senhor nos dá oportunidades!

Mas, se há alguma coisa nesta Terra da qual você ainda pode tirar proveito, e muito, é a Santa Missa. Veja só, na Missa continuamos juntas! Eu posso rezar por você, e você pode interceder por mim, assim, lado a lado, como éramos antes de você partir.

Apenas com algumas diferenças. Hoje, a oração do Pai-nosso só tem eficácia para você se eu rezá-la em seu favor. Aquela parte: "perdoai as nossas ofensas assim como nós perdoamos..." já não faz sentido para quem já se foi. O que você perdoou, perdoou. O que você não perdoou... ficou sem perdoar. Mas se eu rezá-la com fé em seu favor, você será cumulada de graças! Não é maravilhoso isso?

"O pão nosso de cada dia dai-nos hoje" também não tem sentido para você, se aí você nem come! A Ave-Maria, idem: "Rogai por nós, pecadores, agora e na hora de nossa morte" já era. Se você rezou com fé, valeu. Se não... ai ai ai... devo eu rezá-la por você, daqui. Me ajude a rezar com fé, por você, e também por mim e pelos meus e seus, e pelo mundo, pelos pecadores, pela paz.

Lembra-se quando falávamos horas a fio sobre Nosso Senhor? O nosso coração se agigantava quando partilhávamos experiências espirituais e falávamos sobre sermos melhores, sobre o perdão, sobre a compreensão, a oração, a dedicação à família, à Igreja, e aconselhávamo-nos mutuamente. Éramos severas uma com a outra, uma severidade santa. Lutávamos pela nossa santificação. Foram momentos eternos.

E como ríamos! Qualquer coisinha era motivo para grandes gargalhadas! Ríamos das nossas tristezas, dos nossos erros, ríamos de nós, uma da outra. Eu me lembro quando saímos para comprar a sua peruca. Ai, mulher, você queria logo comprar a primeira que viu! 

Lembro que certa vez, quando eu estava com pressa porque tinha que arrumar os meus cabelos para uma festa, você disse: "- Viu? Esse problema eu não tenho. Meus cabelos estão sempre arrumados." e, passando as mãos na peruca: "- Tenho um monte lá na minha casa, quer ir lá escolher um cabelo bonito pra você?" Só você mesmo! Sempre sorrindo, sempre olhando a vida de maneira positiva.

Eu tirava fotos de você e as guardava comigo, porque eu sabia que você logo nos deixaria, e queria vê-la depois, para lembrar dos nossos momentos tão preciosos. Aí estão algumas.

Sabia que, quando eu canto, ainda posso ouvir a sua voz nos meus ouvidos? Sempre tão afinada... No Natal, vindo da Missa para casa, vi no céu uma estrela piscando para mim. Vi mesmo, uma estrela cintilante! Era você? Eu cantei, imaginando a sua segunda voz me fazendo dupla: "Uma estrela a brilhar no infinito azul do céu, já nasceu Jesus, enfim, o nosso grande Rei!" Este foi o primeiro canto em que você aprendeu a fazer o contralto. Ficou toda faceira! Depois aprendeu "A treze de maio..." e você só queria cantar este. Nos ensaios cantava muito bem,  mas quando chegava a hora de cantá-lo valendo, esquecia a sua voz! Ah, mas que coisa!

Aliás, aproveitando a oportunidade, vou te contar um segredo: Logo quando eu soube que você tinha câncer, eu também entendi que o seu tempo aqui nesta Terra seria breve. Então, tratei de "preparar" você para a outra vida. Não sei se ajudou, mas sabe o que fiz? Pedi que você cantasse o Salmo 41, naquele Sábado de Aleluia. Você aprendia rapidinho, e não é que cantou maravilhosamente? Você nem imaginava, mas era o mesmo Salmo que cantaria seguidamente nas Missas de Sétimo Dia. Depois, cada vez que havia uma Missa de Sétimo Dia, eu pedia novamente para você cantar aquele salmo, que era para fixar na sua cabecinha. Perdi de contas de quantas vezes você o cantou, sempre mais lindo! No entanto, você não observava que a letra lhe dizia respeito, que Deus já lhe preparava um lugar, e já lhe preparava a alma. Ou entendia, mas não dizia nada.

A minh'alma tem sede de Deus
e deseja o Deus vivo!

Assim como a corça suspira
pelas águas correntes,
suspira igualmente minh'alma
por vós, ó meu Deus!

Minha alma tem sede de Deus,
e deseja o Deus vivo.
Quando terei a alegria de ver
a face de Deus?

Peregrino e feliz caminhando
para a casa de Deus,
entre gritos, louvor e alegria
da multidão jubilosa.

Por que te entristeces, minh'alma,
a gemer no meu peito?
Espera em Deus, louvarei novamente
o meu Deus Salvador!

Enviai vossa luz, vossa verdade:
elas serão o meu guia;
que me levem ao vosso Monte santo,
até a vossa morada!

Então eu irei aos altares do Senhor,
Deus da minha alegria.
Vosso louvor cantarei, ao som da harpa,
meu Senhor e meu Deus!

Enfim, chegou a SUA Missa de 7º Dia, e eu fiz questão de cantar este Salmo, logo eu, que nunca canto solo e tenho esta vozinha tão mixuruca. A Igreja estava cheia, todos os seus amigos e parentes estavam lá. Mas eu fiz questão de cantá-lo. Qual o quê! Não consegui! Me pus a chorar - você deve ter visto isso, não? Sim, chorei emocionada, imaginando você entrando na Casa de Nosso Senhor "entre gritos, louvor e alegria da multidão jubilosa". Quem diria, hein? Você conseguiu!!!!! Viu como valeu a pena sofrer um pouquinho? Veja bem, foi só um pouquinho, perto do que você vive hoje aí, na eternidade. Sim, valeu a pena!

Às vezes também ouço você me dizer "- Ah, se não sou eu a te ensinar as coisas! Eu tenho que te ensinar tudo! O que seria de você sem mim?", sempre com um sorriso nos lábios.

Mas, veja só, você morreu. E você pensa que só porque morreu vai ficar aí, sem fazer nada, até a vinda de Nosso Senhor? Posto que não. Precisamos da sua "mãozinha", da sua intercessão. Hoje você vê o que não vemos, sabe o que não sabemos. Há muito trabalho pela frente, você já deve ter percebido isso. Então, mãos à obra! Venha cá nos dar uma forcinha, porque o barco aqui está de cabeça pra baixo...

Querida, como sinto falta da sua presença do meu lado! Te amo!, foi a última frase que dissemos uma à outra, no último abraço que demos: "- Te amo!" Um amor transcendente, um amor divino, porque o meu Deus era em você, e o seu Deus era em mim.  Era não, É.  Quando nos abraçávamos, o Espírito Santo nos abrasava, podíamos sentir. Como eram doces esses momentos! Eternos momentos.

Mas, dentro de pouco tempo, talvez dentro de dez ou vinte anos, ou até amanhã, quem sabe?, vamos nos reencontrar, e então "Cantaremos eternamente a bondade do Senhor".

Por ora, deixe-me desapegar das coisas, de todas as coisas, de todas as pessoas, e principalmente de mim mesma. Preciso aprender a fazer uso mais apropriado de tudo que me rodeia, "usar como se não usasse, comprar como se não comprasse", enfim, fazer tudo para a glória do Senhor e para o aperfeiçoamento da minha alma.

Quando chegar a minha hora, esteja pertinho de mim, quero vê-la, quero abraçá-la, tomar a sua mão para corrermos juntas ao encontro de Nosso Senhor, dos anjos, dos santos. Que maravilha será encontrarmos "pessoalmente" aqueles com quem tanto conversamos em nossas orações!

Enquanto esse dia não chega, interceda por mim, e eu rezo por você, minha irmãzinha querida. Te amo!

sábado, 24 de maio de 2014

Jesus está doente!

Como pode estar doente aquele que cura? Como pode estar enfermo aquele que nos concede a vida, que nos dá a saúde? Sim, Jesus está doente! Jesus está doente na sua Igreja.

Nós formamos o Corpo de Cristo, do qual Ele é a Cabeça. Cabeça que pensa, que tem inteligência, que tem vontade, que emite ordens ao Corpo para que ande, para que faça, para que atue, para que aja... e este Corpo não responde. 
Senhor Jesus Cristo, anima a vida em nós. 
Que a nossa vontade seja a Tua vontade, 
que cumpramos as Tuas ordens de ir e vir, e de Te levar para onde quiseres. 
Que as nossas mãos abracem com o Teu abraço toda as almas aflitas. 
Que as Tuas palavras brotem em nossa boca,
palavras que não agridem, palavras de Verdade,
de conversão, que atinjam o íntimo das almas.
Que as nossas mãos se estendam em gestos de amor, 
de ternura e de paz,
que confortem os sofrimentos, as dores.
Que em nosso coração pulse a Tua compaixão 
por todos os extraviados,
que saibamos erguê-los a Ti, elevá-los aos Teus olhos,
para que eles possam Te ver, sentir-Te, como nós Te sentimos.
Que eles possam se unir a nós
como células novas que se multiplicam no Teu Corpo,
renovando o Seu vigor.

Tem misericórdia de nós, Senhor!
Misericórdia e compaixão pela nossa falta de entendimento,
pelas vezes em que colocamos a nossa vontade acima da Tua,
pelas vezes em que murmuramos
quando queres nos usar como Teus instrumentos
para a salvação do Mundo.

Tira de nós, Senhor,
todo queixume, toda irritação, toda auto-complacência
e torna-nos aptos, firmes e decididos
a caminhar, a ir pelos Teus caminhos,
a dar os passos que queres andar.

Somos o Teu Corpo, Senhor!
Sopra em nós, anima-nos a fazer a Tua vontade.
Amém.
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quarta-feira, 14 de maio de 2014

É católico, mas...

É católico, mas aprova a ideologia de gênero.
É católico, mas é a favor do marxismo cultural.
É católico, mas aprova a lei das cotas.
É católico, mas é a favor do desarmamento.
É católico, mas participa das marchas feministas.
É católico, mas é a favor das guerrilhas urbanas.
É católico, mas é socialista / comunista.
É católico, mas é a favor da desapropriação de terras e bens.
É católico, mas é a favor da luta de classes.
É católico, mas defende que o Estado cuide de nossas crianças.
É católico, mas é a favor do aborto.
É católico, mas é contra a família tradicional.
É católico, mas aprova a prostituição.
É católico, mas prega ideologias.
É católico, mas é contra a liberdade.
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Se você conhece alguém com este perfil, FUJA!
São lobos em pele de cordeiros, FUJA!
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Por que o comunismo persegue a Igreja?
- Por que a Igreja segue um modelo patriarcal. Temos um Pai que nos orienta, que nos ouve, que nos acolhe, que nos ama, que nos guia para uma vida honesta, íntegra e santa. Este Pai é o próprio Deus, em quem cremos e a quem obedecemos os Mandamentos. É o Papa, representante de Jesus Cristo nesta Terra, que nos revela a vontade do Pai a nosso respeito e nos mantêm na linha; são os Padres (pais), que nos orientam mais de perto, em nossas paróquias.

Por que o comunismo quer destruir a Família?
- Por que a Família segue o mesmo modelo patriarcal. Toda Família tem um pai, que faz o mesmo papel de orientar, ouvir, acolher, amar, guiar para uma vida honesta, íntegra e santa.

E por que um Pai incomoda tanto um governo totalitário?
- Por que, para o marxismo, a origem das desigualdades sociais está na família. O modelo de "família burguesa", em que o homem toma posse da mulher e dos filhos, deve ser destruído. Os marxistas afirmam que não haverá igualdade social enquanto subsistir a família, pois, segundo eles, a família é a raiz de todas as opressões. Sendo assim, lutam para abolir os papéis tradicionais de pai, mãe, esposo, esposa, pais e filhos, posto que são "opressores".

Na verdade, querem eles assumir esse lugar de pai da sociedade. Querem decidir sobre a vida de todos. Para isso, é preciso tirar o pai natural de circulação. É o que o PT está fazendo, retirando o pai natural (Igreja e Família), de modo que a Casa fique sem mando e se instale o caos entre os filhos da Pátria. 
  • Por isso é que dizemos que o PT é comunista, pois é assim que o comunismo age, é assim que o PT está agindo. 
  • E não existe comunismo cristão. Isto seria uma contradição. Para existir o comunismo, é preciso que sejam afastados todos os tipos de religiões, especialmente as cristãs. O comunismo não consegue entrar em países cristãos. É preciso que o povo se rebaixe e tenha como seu Senhor o Chefe de Governo, e um cristão não abandona a sua dignidade de Filho de Deus.
Depois, com a bagunça instalada no País - uns contra os outros - surgirá o Governo Totalitário como um Pai Salvador, detentor de todo poder, de toda honra e toda glória, que trata todos os seus filhos por igual, sem distinguir suas personalidades, dons e talentos. Esse Governo vem e a primeira coisa que faz é cortar as asinhas dos seus "filhos", retirando-lhes toda liberdade para impedir que fujam e, por fim, solapam-lhes o bolso - porque só um Pai (Estado) sabe o que é bom para o seu filho (povo).

É o Reino da Miséria, porque o que acontece de fato é um país inteiro que se torna escravo de seu governante, trabalhando para ele em troca de migalhas. Prova disso é Fidel Castro, um dos homens mais ricos do mundo, comandante de um povo escravo e miserável. Prova disso é o Porto de Cuba, financiado com o NOSSO dinheiro. 
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Por último: Se comunismo fosse bom, Nossa Senhora não teria descido dos céus, em Fátima, para advertir-nos contra ele. Rezemos, portanto, o Terço: "Por fim, o Meu Imaculado Coração triunfará." - Que venha este fim.
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COMUNISMO: O Ópio do Povo

Comunismo: Ópio do Povo (Mons. Fulton Sheen)
Bispo Auxiliar de Nova York


INTRODUÇÃO
O Comunismo é essencialmente anti-religioso.

Depois da revolução de Outubro de 1917, foi gravada nas paredes do antigo Paço Municipal de Moscou, defronte da Igreja da famosa imagem da Virgem Ibéria[1], esta inscrição: "A Religião é o Ópio do Povo". Esta inscrição foi tirada de um dos escritos de Karl Marx intitulado: Crítica da Filosofia do Direito de Hegel. Já em 1844 Marx dissera: "A crítica da religião é o começo de toda crítica". A orientação anti-religiosa do Comunismo subsistiu até o presente. O sexto Congresso Mundial, levado a efeito em 1928, estabeleceu o programa do Partido Comunista em relação à religião: "A luta contra a religião, o ópio do povo, ocupa importante posição entre as tarefas da revolução cultural. Esta luta deve ser levada avante persistente e sistematicamente". Mais tarde, na segunda conferência do Instituto Anti-religioso, realizada em Moscou a 15 de Junho de 1934, o Bezbojnik, jornal anti-Deus, declarou que "a educação comunista da criança requer explicitamente a educação anti-religiosa". Em Maio de 1935, recordando o efeito do programa anti-religioso dos comunistas, ele declarava: "Fechamos todas as casas de ópio". Isto era o cumprimento da política de Marx tanto como da de Lenine, que, a 16 de Dezembro de 1905, escrevera: "O nosso programa comunista inclui a propaganda do ateísmo" (Novoya Zhizn N.º 28).

I. A RELIGIÃO É O ÓPIO DO POVO?
Não se faz mister insistir no caráter ateísta do Comunismo, porque ele é suficientemente conhecido tanto na teoria como na prática. Antes de tentar qualquer crítica da sua política, seria bom inquirir precisamente as razões que os comunistas alegam em abono da sua afirmação de que a religião é o ópio do povo. Os comunistas não fizeram essa asserção sem alguma base, porquanto, como Lenine escreveu: "Devemos explicar de um ponto de vista materialista a razão pela qual a fé e a religião prevalecem no meio das massas" (Proletarii N.º 45, 26, (13), Maio de 1909). Resta, portanto, investigar-lhes as alegadas razões.

A Argumentação Comunista
Procurando através da sua literatura de caráter oficial, encontramos que os comunistas invocam três razões em abono da sua afirmação de que a religião é o ópio do povo:
1) A religião ensina aos ricos os seus direitos, e portanto ajuda os ricos na sua exploração dos pobres;
2) A religião ensina aos pobres os seus deveres para com os ricos, e destarte ajuda a exploração dos pobres pelos ricos;
3) A religião, pela sua própria natureza, é passiva, e mata toda atividade por meio da qual o homem possa melhorar a sua condição econômica.

1. "Religião, patrocinando a causa dos ricos".
Lenine desenvolve o primeiro argumento, de que a religião é o ópio do povo porque proclama os direitos dos capitalistas e dos ricos. Desenvolve-o assim: "A religião é uma espécie de tóxico espiritual, no qual os escravos do capital afogam a sua humanidade e embotam o seu desejo de uma existência humana decente" (Novoya Zhizn N.º 28). Acrescenta, mesmo, que a religião incentiva a caridade como uma espécie de escusa para a injustiça. "Porque aos que vivem do trabalho dos outros, a religião ensina a serem caridosos, arranjando assim uma justificação para a exploração, e como se fosse um bilhete barato para o céu" (íbid.). Houharin, na obra oficial do Comunismo intitulada O ABC do Comunismo, desenvolve a mesma idéia: "A religião foi no passado, e ainda é hoje, um dos meios mais poderosos à disposição dos opressores para a mantença da desigualdade, exploração e servil obediência por parte dos trabalhadores" (p. 247).

2. "Religião, sedativo dos pobres".
Os comunistas alegam que a religião é o ópio do povo porque ensina aos pobres os seus deveres para com os ricos, e lhes promete uma outra vida ao invés de melhorar a presente. Lenine escreveu: "A fé ortodoxa é cara a eles porque lhes ensina suportarem os infortúnios "sem queixa". Que fé proveitosa não é essa, realmente — para as classes governamentais t Numa sociedade organizada de tal modo que uma insignificante minoria desfruta a riqueza e o poder, ao passo que as massas constantemente sofrem privação e severas obrigações, inteiramente natural é simpatizarem os exploradores com essa religião que nos ensina a suportar "sem queixa" as dores do inferno na terra, na esperança de um prometido paraíso no céu" (Iskra N.º 16, 14 de Fevereiro de 1902). E novamente: "A religião ensina aqueles que labutam na pobreza toda a sua vida a serem resignados e pacientes neste mundo, e consola-os com a esperança de uma recompensa no céu... O desamparo de todos os explorados na sua luta contra os exploradores gera inevitavelmente a crença numa vida melhor após a morte, tal como o desamparo do selvagem nas suas lutas com a natureza dá nascimento a uma crença em deuses, demônios e milagres" (Novaya Zhizn N.º 28, 16 de Dezembro de 1905).

3. "Religião, entorpecente da humanidade"
O terceiro argumento oferecido pelos comunistas em abono da sua afirmação de que a religião é o ópio do poro é o de que, pela sua própria natureza, a religião torna o homem passivo. Pregando constantemente a resignação à própria sorte e a resignação à vontade de Deus, ela adormenta o homem ativo e torna-o descuidado no tocante à sua condição econômica. Por exemplo, na sua obra O ABC do Comunismo, N. Houharin declara que "há um conflito irreconciliável entre os princípios do Comunismo e os mandamentos da religião". E, como uma evidência do caráter passivo da religião, cita ele o código cristão: "Quem quer que te ferir na face direita, oferece-lhe também a outra". E então acrescenta: "Todo aquele que, embora chamando-se comunista, continua a aderir à sua fé religiosa, quem quer que em nome dos mandamentos religiosos infringe as prescrições do Partido, por isso mesmo cessa de ser comunista. É proveitoso para a classe rapinante manter a ignorância do povo e manter a crença infantil do povo em milagres (a chave do enigma fica realmente no bolso dos exploradores), e é por isto que os preconceitos religiosos são tão tenazes; é por isto que eles confundem as mentes mesmo de pessoas que, a outros respeitos, são capazes'' (p. 248).

Uma distinção a fazer.
Tal é a atitude oficial do Comunismo para com a religião, apresentada nas palavras dos seus melhores expoentes. Resta agora julgar-lhes as razões calma e desapaixonadamente. Antes de iniciarmos uma apreciação crítica desses argumentos, uma reflexão geral deve ser feita, a saber: devemos distinguir cuidadosamente entre o que a religião é naqueles que se professam religiosos, e o que a religião é na sua natureza e no seu programa. No tocante aos que se professam religiosos, deve-se admitir que há alguns exemplos em que a religião foi usada como ópio do povo. Não há dúvida de que às vezes indivíduos inescrupulosos têm usado a religião como um instrumento de exploração e domínio. Pedro o Grande na Rússia, Napoleão na França, e mesmo o último Czar, oferecem exemplos clássicos de semelhante abuso da religião. Um professor da Universidade de Yale, falando do declínio da Cristandade não-católica, atribui isso principalmente à identificação que alguns pregadores têm feito entre religião e uma ordem social decadente que às vezes tem sido ré de exploração.

No tocante a esses indivíduos que têm usado para fins baixos a instituição social da religião, compartilhamos a indignação de Lenine. Porém o que ele e seus companheiros comunistas esquecem é que essas são exceções, e não estão no espírito nem no programa da religião. Nunca poderíamos admitir que a religião que Nosso Senhor fundou tenha favorecido o rico contra o pobre. As palavras de advertência do Mestre ainda nos soam aos ouvidos: "Bem-aventurados os pobres em espírito... Ai de vós que sois ricos... Já tendes a vossa recompensa... As raposas têm tocas, as aves do ar têm ninhos, mas o Filho do Homem não tem onde pousar a cabeça". A História inscreveu-o nos seus registros como o Pobre universal, o qual, no seu nascimento, teve de se contentar com um abrigo que não lhe pertencia, e, na sua morte, com um túmulo alheio. A história da religião que Ele fundou é a história de uma Igreja que por dezenove séculos tem cuidado dos pobres e dos fracos e dos enfermos em hospitais e orfanatos e escolas e instituições de caridade, e isso por nenhuma outra razão senão a de que ela vê a Cristo no pobre. Atitude muito infantil, revelando falta de raciocínio crítico da parte dos comunistas, é argüirem eles que, pelo fato de alguns poucos haverem prostituído a santidade da religião, por isto a religião é vil. O fato de haver algumas moedas falsas no mundo não é razão para se abolir o dinheiro; o fato de haver alguns indivíduos que praticam bandalheiras não é razão para se suprimir o governo; o fato de alguns automobilistas serem negligentes não é razão para que se destruam os automóveis; e o fato de haver alguns que traem o Cristianismo não é razão para se destruir o Cristianismo.

Refinação dos Argumentos Comunistas
Resta agora discutir por miúdo os três argumentos dos comunistas.

1. A Religião e os ricos.
Primeiramente, será verdade que a religião é o ópio do povo pelo fato de ensinar aos ricos os seus direitos? Desafiamos os comunistas a apontarem, em toda a história da Igreja, uma única passagem oficial em que ela use a religião como ópio do povo. Karl Marx nos seus melhores momentos e Lenine nos seus mais amargos, nunca protestaram com tanta justiça e com tanta delicadeza e exatidão contra a exploração dos pobres pelos ricos, como o fizeram Leão XIII e Pio XI. Será que esta advertência de Leão XIII, por exemplo, soa como se ele estivesse defendendo os direitos do rico?: "Os ricos e os patrões devem lembrar-se de que explorar a pobreza e a miséria e especular com a indigência, são coisas igualmente reprováveis pelas leis divinas e humanas" (Rerum Novarum, Ed. Vozes, n.º 32). E Pio XI, com maior ênfase, condena os ricos que são réus de exploração e de domínio:

"É coisa manifesta que em nossos tempos não só se amontoam riquezas, mas se acumula um poder imenso e um verdadeiro despotismo econômico nas mãos de poucos, que as mais das vezes não são senhores, mas simples depositários e administradores de capitais alheios, com que negociam a seu talante. Este despotismo torna-se intolerável naqueles que, tendo nas suas mãos o dinheiro, são também senhores absolutos do crédito e por isso dispõem do sangue de que vive toda a economia, e de tal maneira a manejam, que ninguém pode respirar sem sua licença. Este acumular de poderio e recursos, nota característica da economia atual, é conseqüência lógica da concorrência desenfreada, à qual só podem sobreviver ordinariamente os mais fortes, isto é, os mais violentos competidores e que menos sofrem de escrúpulos de consciência. Por outra parte, este mesmo acumular de poderio gera três espécies de lutas pelo predomínio: primeiro luta-se por alcançar o predomínio econômico; depois combate-se renhidamente por obter o predomínio no governo da nação, a fim de poder abusar do seu nome, forças e autoridade nas lutas econômicas ; enfim, lutam os Estados entre si, empregando cada um deles a força e influência política para promover as vantagens econômicas dos seus cidadãos, ou ao contrário empregando as forças e predomínio econômico para resolver as questões políticas que surgem entre as nações" (Quadragesimo Anno, Ed. Vozes, nº 105-108).

Nessa mesma Encíclica o Santo Padre parece insinuar que, a menos que os ricos ponham a sua casa em ordem, devem estar preparados para a subversão da sociedade que o Comunismo fará cair sobre eles: "Digna de censura é a inércia daqueles que não tratam de suprimir ou mudar um estado de coisas que, exasperando os ânimos, abre caminho à subversão e ruína completa da sociedade" (Quadragesimo Anno, Ed. Vozes, nº 112).
Não há aqui, da parte da Igreja, apelo em favor disso a que chamamos liberdade econômica de amontoar riqueza sem consideração com a justiça social; Leão XIII também já condenara esse erro do Liberalismo. As Encíclicas indicam muito bem que a riqueza protege aqueles que a possuem, e não os que não a possuem; que a iniciativa abre novos horizontes para aqueles que podem conseguir a independência, mas não para aqueles que são escravos de salários semanais. Mas, pelo fato de haver a riqueza muitas vezes redundado em exploração, a solução das Encíclicas não é a dos comunistas, que quereriam destituir os homens da sua propriedade. O Santo Padre sustenta que a solução dos nossos males não está na destituição, porém na distribuição; se há ratos no celeiro, não é isto razão para que se toque fogo ao celeiro; é razão somente para que se enxotem os ratos.

Nem é verdade, como Lenine insinuou, que a Igreja pede aos ricos serem caridosos com o fim de cobrirem as suas injustiças, dando-lhes assim um bilhete fácil para o céu. Como Pio XI afirma: "As riquezas terrenas não são garantia daquela bem-aventurança que nunca findará, antes pelo contrário, porquanto os ricos deveriam tremer ante a ameaça de Jesus Cristo — ameaça tão estranha na boca de Nosso Senhor, — de que muito estrita conta deve ser dada ao Supremo Juiz por tudo quanto possuímos". E se isto ainda não é bastante forte, então ouçamos as palavras de Pio XI sobre a caridade em relação com a justiça: "Com tal estado de coisas (divisão da sociedade em duas classes) facilmente se resignavam os que, nadando em riquezas, o supunham efeito inevitável das leis econômicas, e por isso queriam que se deixasse à caridade o cuidado de socorrer os miseráveis; como se a caridade houvesse de cobrir estas violações da justiça, que os legisladores toleravam e, por vezes, sancionavam" (Quadragesimo Anno, Ed. Vozes, n.º 4). Em face destas afirmações oficiais da Igreja, semelhante às quais nem uma simples página existe em toda a literatura comunista, imediatamente evidente deveria ser que a religião não é o ópio do povo pelo fato de ensinar aos ricos os seus direitos. Estas passagens do Santo Padre acentuam, antes, os deveres dos ricos, e para um comunista é muito inconveniente acusar a Igreja de se aliar somente com os ricos, quando às almas a ela consagradas ela pede fazerem voto de pobreza. Não podemos colher uvas de abrolhos; como então poderia a Igreja colher da sua vinha o Pobrezinho de Assis, se plantasse somente o amor dos ricos?

2. A Religião, defensora dos pobres.
A Igreja nunca foi unilateral a ponto de ensinar aos pobres somente os seus deveres. Os comunistas não podem apontar uma simples linha, em toda a história da Igreja, na qual ela tenha pedido aos pobres se submeterem à exploração. Pelo contrário, a Igreja ensina que o Estado tem deveres para com os pobres. Leão XIII diz: "Assim como o Estado pode tornar-se útil às outras classes, assim também pode melhorar muitíssimo a sorte da classe operária; .. .e quanto mais se multiplicarem as vantagens desta ação de ordem geral, tanto menos necessidade haverá de recorrer a outros expedientes para remediar a condição dos trabalhadores" (Rerum Novarum, Ed. Vozes, n. 48). Não é apenas uma questão de caridade para com o pobre; é, antes, uma questão de verdadeira justiça, e uma questão que reclama aplicação estrita, se não por outra razão, ao menos pelo fato de serem os pobres a maioria.
"Os pobres, com o mesmo título que os ricos, são, por direito natural, cidadãos; isto é, do número das partes vivas de que se compõe, por intermédio das famílias, o corpo inteiro da nação, para não dizer que em todas as cidades são o grande número. Como, pois, seria desrazoável prover a uma classe de cidadãos e negligenciar outra, torna-se evidente que a autoridade pública deve também tomar as medidas necessárias para salvaguardar a salvação e os interesses da classe operária. Se ela faltar a isto, viola a estrita justiça que quer que a cada um seja dado o que lhe é devido. A esse respeito S. Tomás diz muito sabiamente: "Assim como a parte e o todo são em certo modo uma mesma coisa, assim o que pertence ao todo pertence de alguma sorte a cada parte" (II-II, q. 61, a. 1,

2). É por isso que, entre os graves e numerosos deveres dos governantes que querem prover, como convém, ao bem público, o principal dever, que domina todos os outros, consiste em cuidar igualmente de todas as classes de cidadãos, observando rigorosamente as leis da justiça, chamada distributiva" (Rerum Novarum, Ed. Vozes, n. 49).

Se houver possibilidade de escolha, devem os pobres ser favorecidos de preferência aos ricos: "Na proteção dos direitos particulares, o Estado deve preocupar-se, de maneira especial, dos fracos e dos indigentes. A classe rica faz das suas riquezas uma espécie de baluarte e tem menos necessidade da tutela pública. A classe indigente, ao contrário, sem riquezas que a ponham a coberto das injustiças, conta principalmente com a proteção do Estado. Que o Estado se faça, pois, sob um particularíssimo título, a providência dos trabalhadores, que em geral pertencem à classe pobre" Rerum Novarum, Ed. Vozes, n. 54).

É precisamente contra a exploração dos pobres que o Pontífice protesta, e em particular contra essa exploração que o Comunismo pratica, a saber, o trato dos homens como outros tantos estômagos a fazerem dinheiro para o Estado.

"No que diz respeito aos bens naturais e exteriores, primeiro que tudo é um dever da autoridade pública subtrair o pobre operário à desumanidade de ávidos especuladores, que abusam, sem nenhuma discrição, das pessoas como das coisas" (Rerum Novarum, Ed. Vozes, n. 59).

Nem é verdade, como diz Lenine, que a Igreja não faz outra coisa senão ensinar "aqueles que labutam na pobreza a vida toda a serem resignados e pacientes neste mundo, e consolá-los com uma recompensa no céu". A verdade é o contrário: "Nem se pense que a Igreja se deixa absorver de tal modo pelo cuidado das almas, que põe de parte o que se relaciona com a vida terrestre e mortal. Pelo que em particular diz respeito à classe dos trabalhadores, ela faz todos os esforços para os arrancar à miséria e procurar-lhes uma sorte melhor. E, certamente, não é um fraco apoio que ela dá a esta obra só pelo fato de trabalhar, por palavras e atos, para reconduzir os homens à virtude. Os costumes cristãos, desde que entram em ação, exercem naturalmente sobre a prosperidade temporal a sua parte de benéfica influência; porque eles atraem o favor de Deus, princípio e fonte de todo o bem; comprimem o desejo excessivo das riquezas e a sede dos prazeres, esses dois flagelos que freqüentes vezes lançam a amargura e o desgosto no seio mesmo da opulência (1 Tim 6, 10); contentam-se enfim com uma vida e alimentação frugal, e suprem pela economia a modicidade do rendimento, longe desses vícios que consomem não só as pequenas, mas as grandes fortunas, e dissipam os maiores patrimônios" (Rerum Novarum, Ed. Vozes, n. 42).

Para que não fosse deixado vago o interesse pela prosperidade terrena do homem, Pio XI adita à concreta sugestão de Leão XIII uma recomendação que é o contrário do Comunismo, como seja — ajudar os trabalhadores a possuírem a propriedade. Não arrancá-la e tornar milionários os "leaders" do Partido Comunista; porém dá-la aos pobres como posse deles: "É, pois, necessário empregar energicamente todos os esforços, para que, ao menos de futuro, as riquezas granjeadas se acumulem em justa proporção nas mãos dos ricos, e, com suficiente largueza, se distribuam pelos operários; não para que estes se dêem ao ócio, — já que o homem nasceu para trabalhar como a ave para voar, — mas para que, vivendo com parcimônia, aumentem os seus haveres, aumentados e bem administrados provejam aos encargos da família; e, livres assim de uma condição precária e incerta qual é a dos proletários, não só possam fazer frente a todas as eventualidades durante a vida, mas deixem ainda por morte alguma coisa aos que lhes sobrevivem" (Quadragesimo Anno, Ed. Vozes, n. 61).

3. A Religião, estimuladora das atividades humanas.
Consideremos agora o argumento dos comunistas de que a religião torna o homem passivo.

a) Provavelmente, não haverá maior perversão da verdade do que esta afirmação do Comunismo. O contrário é que é verdade. A religião é essencialmente dinâmica. A Igreja, é verdade, prega-nos a resignação à nossa própria sorte, mas isto não significa passividade. Antes, é uma resignação orientada para a ação. Resignação significa aceitação da nossa sorte enquanto se aguardam melhores coisas que devem ser alcançadas não por meio de revolução, mas mediante atuação inteligente. Não é esta a atitude de uma mãe para com seu filhinho? Ela se resigna à infância deste, mas isto não quer dizer que ela se recuse a criá-lo e educá-lo até que ele entre na adolescência e na maturidade. O lavrador que semeia a sua semente resigna-se ao fato de ter ela de crescer mediante um processo lento, misterioso, pois nem em pensamento pode ele aumentar um côvado à sua própria estatura. Porém semelhante resignação não significa que ele não deva cultivar a sua seara, ou não deva extirpar o joio ou receber com agrado a ação do sol e da chuva. De igual modo, quando a Igreja fala de resignação cristã, entende dizer que devemos trabalhar efetivamente pela melhoria social como o lavrador o faz com sua semente, isto é, que nos devemos capacitar de que toda reforma deve proceder de uma verdadeira consideração da natureza da coisa a ser reformada. Ela repudia o sistema comunista, por saber que não se pode criar um paraíso terrestre econômico mediante uma revolução, tão pouco como se pode fazer uma criança crescer acendendo-lhe uma bomba debaixo do berço.
b) Por que é que os comunistas não podem ver esse fato óbvio de que, se a religião acentuasse a passividade do homem, então nunca admitiria a terrível realidade do pecado? O pecado não significa que o homem é consciente, deliberado e ativo, e que a criatura pode levantar o seu Non serviam contra o Criador? O próprio símbolo do Cristianismo, que é a Cruz, atesta melhor do que qualquer outra coisa a atividade do homem na religião. Diante dessa Cruz o homem não pode ficar indiferente; não pode ser passivo; ou tem de pregar nela o Salvador, ou tem de subir a ela para ser crucificado com Ele. Se a religião é passiva, por que então os comunistas hão de ser tão ativos para destruí-la? Acaso organizamos exércitos para matarmos aquilo que acreditamos serem cães mortos? Se a religião é passiva, por que então incentivava o martírio entre os católicos na Espanha? Realmente, se a religião é um ópio, é uma estranha espécie de ópio que faz mártires.

c) Além disto, se for verdade que o Cristianismo lança toda a responsabilidade sobre Deus, então como explicarmos a sua filosofia do progresso técnico? De acordo com a Igreja, todo progresso na ciência e na tecnologia é devido à livre atividade do homem. Por que é que ela condena o quietismo, senão por ser ele bastante néscio para esperar que Deus diga por nós as nossas preces, como néscio é esperar que Deus venha em pessoa cultivar as nossas searas? Deus dá ao homem a graça para elevá-lo e sustentá-lo num estado sobrenatural; mas a invenção das suas máquinas, o incremento da sua agricultura, a melhoria da sua condição econômica deve vir dele mesmo, como causa secundária, ainda mesmo quando ele reconheça a Deus como causa primária. Um dos princípios mais básicos da filosofia católica é que o controle sobre a natureza, que é o requisito da ciência, só é possível a um espírito superior à natureza. Quer isto dizer que todo progresso científico, todo progresso técnico e adiantamento cultural procede do homem, cuja liberdade é conseqüência da espiritualidade da sua alma. Por que é que as pedras não podem conhecer? Por que é que a erva não pode pensar e refletir no seu crescimento? Por que é que o ferro, nas entranhas da terra, não pode clamar pela sua libertação? É porque essas coisas não têm um espírito desligado da sua materialidade; é porque cada uma delas está tão imersa na matéria, que não pode voltar-se sobre si mesma para jazer alguma coisa consigo mesma. Mas um homem pode justamente fazer isso; pode pensar sobre si mesmo, entristecer-se com os seus fracassos e alegrar-se com os seus êxitos, porque tem uma alma que transcende à matéria. É o espírito que o torna livre; e, pelo fato de ser livre da matéria, ele pode transformar a matéria: converter árvores em estátuas, pedras em edifícios, carvão em calor, e a insignificância de um carbono no brilho de um diamante. Porém o Comunismo, partindo do princípio de que só há matéria, é, por isso, incapaz de explicar o progresso científico, ou por que razão o homem pode edificar mil cidades diferentes, e uma formiga tem de construir sempre um formigueiro. Negar o espírito é negar a liberdade, negar a liberdade é arruinar a atividade criadora do homem — e tal é a essência do Comunismo. Daí achar-se ele na contingência de deixar inexplicada a própria coisa que ele exalta, ou seja o progresso técnico. Ele nos diz que a civilização muda com as suas ferramentas, mas não nos diz por que razão o homem faz ferramentas e não as fazem os esquilos. De fato, se há filosofia que torne o homem passivo, é a filosofia que diz ao homem que ele é apenas material; porquanto podeis imaginar algo mais passivo do que uma ferramenta?

d) Finalmente, a religião é dinâmica porque se interessa pelo futuro. O Comunismo assevera que os pensamentos acerca do futuro tornam o homem passivo. Se isto é verdade, por que então eles insistem tanto no Plano Qüinqüenal? É o futuro ou é o presente que faz a vaca ficar satisfeita com o seu pasto? A verdade é esta: quanto mais ideal é o futuro, tanto mais forte é o incentivo à ação. O simples fato de eu ter que tomar uma refeição amanhã não reclama grande ação da minha parte hoje. Mas o fato de eu querer ser médico ou advogado em dez anos dá-me energias para dez anos de estudo. Ora, o futuro que a religião ostenta diante do homem não é somente uma consciência tranqüila todos os dias da sua vida, mas também uma eterna recompensa na outra. Destarte o cristão é convidado a ser um homem de ação tal, que, se lhe forem dados dez talentos, deve ele ganhar mais outros dez para conquistar o reino dos céus, e, se lhe forem dados cinco, deve ele ganhar mais cinco; porém ai dele se for passivo e enterrar o seu talento dentro de um guardanapo — então, até mesmo aquilo que ele tem ser-lhe-á tirado. A religião é tão ativa que baseia o seu incentivo numa intérmina vista de perfeição. Ao cristão é dito que ele deve não somente correr a corrida ou combater o bom combate, porém ganhar; e que a coroa só virá àqueles que são bastante enérgicos para tomar uma cruz, ser benignos para com os que blasfemam, bendizer os que os perseguem e dizer "perdoai-lhes" até mesmo àqueles que nos pregam numa cruz. Isto é ação, e o comunista que disser que não é deve experimentar viver por um dia a vida ativa de um santo. Então descobrirá que, quando se rouba a um homem o seu ideal futuro, rouba-se a esse homem a sua força motriz para agir. Porquanto, se esta vida é tudo, então que diferença faz, para o regime comunista, que eu viva mal ou bem? Se esta vida presente é um mero sonho entre dois vácuos, então por que construir um túmulo para Lenine e não o construir para um fiel cavalo velho numa fazenda coletiva? Se ambos têm o mesmo fim, e se ambos são materiais, então por que um deve ser honrado de preferência ao outro? Certamente, no fundo dos seus corações os comunistas devem perguntar-se que lhes aproveita encherem o mundo de tratores e perderem suas almas imortais. E, do momento em que eles fizerem a si esta pergunta, começarão a ser ativos como os cristãos, planejando não somente como hão de salvar suas colheitas, mas também como hão de salvar as suas almas.

II. O COMUNISMO É O ÓPIO DO POVO!
Sucede com freqüência certos indivíduos acusarem outros de pecado, com o fim de encobrirem os seus próprios. Isto também é verdade no Comunismo. Este tem acusado a religião de ser o ópio do povo, para encobrir o fato de ser o próprio Comunismo o ópio do povo. E por que é ele o ópio do povo? Por três razões :
1) Porque explora os pobres, submetendo-os à vontade do Partido Comunista;
2) Porque adormece os pobres prometendo-lhes algo que ele nunca pode dar, a saber: um paraíso terrestre;
3) Porque torna o homem passivo, fazendo-o um instrumento do Partido Comunista.

1. O Comunismo justifica a exploração do trabalhador pelo Partido.
O Comunismo é o ópio do povo porque mascara as injustiças da exploração comunista; ou, trocando apenas uma palavra numa sentença de Lenine: "O Comunismo é uma espécie de intoxicação espiritual que fornece uma justificação para a exploração". Ele engana o proletariado dentro da crença de que eles devem sofrer tudo para estabelecer a revolução mundial, ao passo que o Partido em controle se ceva em poder, privilégio e luxo. Para compreender esta afirmação devemos considerar o fato de que há menos de três milhões de membros do Partido Comunista na Rússia, e de que, pelo terror e pela propaganda, esses poucos milhões governam cento e sessenta milhões. A máscara favorita do Partido para a exploração é o seu ódio ao capitalismo, capitalismo que ele diz ter reduzido os trabalhadores a pó. Na realidade, o Comunismo não é inimigo do capitalismo. Antes, o Comunismo tem ignorado certos aspectos benéficos do capitalismo, e tem elevado a uma filosofia da vida todas as suas formas perversas e corrompidas. O capitalismo disse que o fim econômico é o principal fim do homem; o Comunismo diz que o fim econômico é o único fim do homem. O capitalismo muitas vezes pagou ao operário um salário tão baixo, que este não podia possuir casa própria; o Comunismo paga um salário ainda mais baixo, e nega ao operário o direito de possuir sua casa. O capitalismo desenvolveu o egoísmo individual; o Comunismo gera o egoísmo coletivo. O capitalismo concentrou a riqueza nas mãos de alguns; o Comunismo concentra a riqueza nas mãos do Partido. O capitalismo até certo ponto controlou o contrato de salário, controlando a maioria dos empregos; o Comunismo elimina o contrato de salário, controlando todos os empregos; nele há só um patrão, o Partido, e, se recusardes trabalhar para esse patrão, perdereis o direito de comer — pois na Rússia não há caridade. O Comunismo é o capitalismo enlouquecido, e um comunista é um capitalista que tem ganância no coração mas não tem dinheiro no bolso.

Ponha-se uma vez a máscara do Comunismo, e a exploração dos trabalhadores é fácil; se o Plano Qüinqüenal falhar, lance-se a culpa sobre os operários nos campos, por haverem recusado cooperar com os ideais do Partido. Que pensaríamos nós se o Ministério da Agricultura fuzilasse trinta e cinco dos seus funcionários, sem processo, por causa de um fracasso de colheita, ou se o Governo fuzilasse quarenta e oito dos seus especialistas, sem processo, por haver a produção declinado? Todavia, foi justamente isto que o Partido Comunista fez em 1930 e 1933. Que sucederia no nosso País se alguma grande organização produtora afixasse amanhã de manhã no seu quadro de avisos o Código 47 da União Soviética, para o fim de que todo empregado que faltasse ao trabalho por um dia perdesse o emprego, e ele e sua família fossem privados das suas posses (Izvestia, 21 de Novembro de 1932)? Não chamaríamos de explorador o nosso Governo se, na sua ânsia de colher uma grande safra, mesmo na área seca, publicasse uma nota proibindo os agricultores de comerem as próprias espigas de milho que eles haviam plantado e cultivado? Contudo, foi isto o que o Partido Comunista fez aos famintos lavradores das fazendas coletivas na Rússia, rezando a nota: "O culpado deve ser fuzilado e seus bens confiscados" (Izvestia, 8 de Agosto de 1932). Suponde que, por causa do decréscimo nas colheitas, o nosso Departamento de Agricultura ordenasse às crianças "guardarem os campos mesmo durante a noite, desde que tenham oito anos de idade" (Moldaia Guardia, 17 de Agosto de 1935); não seria isto uma máscara para encobrir a mais diabólica espécie de exploração? Suponde, ademais, que o Presidente confiscasse toda propriedade privada, e depois, em nome de um Brasil maior, fizesse o lavrador pagar, por uma broa ou por um pão, dezenove vezes mais do que o governo deu ao lavrador pelo seu trigo (Izvestia, 26 de Setembro de 1935)! Contudo, esta é a situação na Rússia, país sem intermediários, porém com centenas de funcionários desonestos.
Certamente, se o termo exploração pertence a alguém, deve ser aplicado àqueles que o usam mais para encobrir os seus próprios pecados, ou seja àquele país onde o Comunismo ilude o explorado trabalhador mantendo baixos os salários dos funcionários públicos e altos os seus privilégios — tais como cartões especiais, casas de férias, carros particulares, transporte especial e casas de luxo; — onde o operário é tão explorado para efeito de comércio exterior e de propaganda, que em 1934 o Estado produziu para cada cidadão, no seu clima frio, somente 2/5 de uma jarda de fazenda de lã e 11/10 de jardas de fazenda de linho (Izvestia, 22 de Abril de 1935), e para cada 4,5 pessoas somente um par de sapatos. A exploração torna-se nada menos que criminosa quando diz aos trabalhadores que há tanto trigo que eles não precisam mais de racionamento de pão; mas, de fato, fecha os armazéns das cooperativas onde eles podem comprá-lo a preço mais ou menos razoável, e força-os a comprar em armazéns comerciais onde se sabe que o preço é muitas vezes mais alto. Em virtude desta exploração, o Partido Comunista alardeou haver aumentado a sua renda de vinte e quatro bilhões de rublos para 1935 (Za Ind., 9 de Fevereiro de 1935). Não é, pois, de admirar que uma das anedotas mais populares na Rússia seja a de um explorado operário pendurado precariamente a um coletivo superlotado, e que, quando viu Stalin e seus ajudantes passarem perto num Rolls-Royce, observou sarcasticamente: "Eu sou o patrão. Esses são os meus caixeiros".

2. O Comunismo engana o pobre com a esperança falaz de um paraíso terrestre.
O Comunismo é o ópio do povo porque adormece os pobres prometendo-lhes algo que nunca lhes pode dar, ou seja um paraíso terrestre. Mudando apenas uma palavra numa sentença de Lenine: "O Comunismo ensina aqueles que labutam toda a sua vida em pobreza a serem resignados e pacientes neste mundo, e consola-os pelo pensamento de um paraíso terrestre". Singular espécie de paraíso esse, que é inaugurado pelo morticínio, pelo exílio e pelo confisco; estranha espécie de paraíso esse, que espera estabelecer a fraternidade pregando a luta de classes, e estabelecer a paz praticando a violência. Estranha espécie de paraíso esse que tem de recorrer ao temor e à tirania para impedir que alguém "escape" dele. Um anjo teve de conduzir Adão e Eva para fora do Éden; mas parece que tantos foram os que tentaram escapar do paraíso de Stalin, que este publicou um decreto no Izvestia de 9 de Junho de 1934, para o efeito de que, se alguém tentasse fugir, a sua família inteira seria mandada para o exílio e para o trabalho forçado por cinco anos, mesmo se não soubesse nada da intenção dele; também seria privada dos direitos eleitorais, o que significava perda dos cartões de alimentação. Estranho paraíso esse em que, no meio de uma fome, Kalinin, o Presidente da U. S. S. R., disse aos camponeses que as colheitas eram pequenas porque eles comiam pão demais (Izvestia, 10 de Janeiro de 1936). O Comunismo é realmente o ópio do povo quando, de um lado, permite que pelo menos cinco milhões de pessoas morram de fome na Ucrânia e no norte do Cáucaso pelo fato de o Estado exigir dos operários duas ou três vezes a safra dos anos anteriores; e, de outro lado, anuncia no seu jornal, o Pravda (28 de Julho de 1933) : "A União Soviética é o único país no mundo que não conhece a pobreza". Não admira que o povo russo diga que não há Verdade (Pravda) nas Novidades (Izvestia) e não há Novidades na Verdade.

O Comunismo é realmente o ópio dos pobres quando lhes diz que aboliu completamente o desemprego na Rússia, embora ocultando o trágico fato de que qualquer país estaria sem desemprego se houvesse nele conscrição de trabalho em massa. Lá, o homem desempregado tem de aceitar trabalho onde quer que este lhe seja oferecido, mesmo quando a mil milhas de distância, porque não há senão o Estado que emprega; e, se o operário recusar o emprego, não poderá ir para nenhum outro lugar. O Brasil também poderia abolir o desemprego se o Presidente assumisse poderes ditatoriais e declarasse que cada cidadão tinha de fazer para o Estado um trabalho prescrito, em troca de comida e de roupa. Chamberlin, que passou doze anos na Rússia, declarou que as famílias socorridas na América estão em melhores condições do que muitos dos lavradores russos. Knickerbocker, jornalista americano, comparando o custo de vida na U. S. S. R. e nos Estados Unidos, avaliou o salário diário de um kolkhozian (lavrador numa fazenda coletivista) em oito centavos americanos. Para que essa estimativa não seja considerada falsa, seria bom reportar-se ao Jornal de Instrução Comunista (publicação comunista, 18 de Novembro de 1934), onde é declarado que um lavrador que conserva consigo uma vaca deve dar ao Estado, por esse privilégio, 136 quartilhos de leite e 50 libras de carne. O salário médio de um trabalhador na Rússia é de 225 rublos por mês. Uma indicação do poder de compra desse salário é proporcionada pelo fato de ser preciso o salário de três semanas para comprar um par de sapatos (Sovietskaia Torgovlia, Ns. 99 e 110, 1936). Há algumas cidades na Rússia onde é quase impossível comprar umas calças, p. e., Kharkov, Gorki, Rostov (Izvestia, 10 de Março de 1936). O diário oficial de Moscou diz: "Nenhum armazém em Moscou pode dizer quando será possível fornecer mercadoria" (Izvestia, 28 de Junho de 1936). Mikoyan, o Comissário da Indústria de Alimentação, disse: "Na República Soviética estamos acostumados a ter somente mercadorias de má qualidade, e sempre em quantidades insuficientes" (Izvestia, 27 de Dezembro de 1935). Soulimov, Presidente dos Comissários do Povo, disse: "Tudo está a um nível muito baixo, exceto os preços, que são exorbitantes" (Pravda, 31 de Julho de 1936).

E assim a citação de fatos poderia prosseguir indefinidamente. Todos eles contam a mesma história, a saber: o Comunismo é o ópio do povo porque explora os pobres prometendo-lhes o impossível, mesmo nesta vida. A Religião, é verdade, faz crer numa vida futura; mas nunca pediu aos homens que, na esperança de uma sorte futura, se resignassem a condições tais como existem na Rússia. Quem quer que leia o autorizado livro do Dr. Ewald Ammende, A Vida Humana na Rússia (Alien and Unwin, 1936, Londres), verá como os russos se acham mal sob o domínio dos comunistas. As fotografias das vítimas da fome por si só contam uma história, independentemente do texto. Ali não somente sofre a vida humana, mas sofre até mesmo a vida animal.

3. O Comunismo escraviza o cidadão, reduzindo-o a mero instrumento do Partido.
O Comunismo é o ópio do povo porque, colocando toda iniciativa e responsabilidade sobre o Partido, destrói a personalidade do homem, e o torna passivo. Nos países do mundo, tais como o nosso, onde o governo é distinto de um partido, um homem é livre de afirmar a sua personalidade e de escolher o seu destino. Sob o Comunismo, só há um partido, e é o Partido Comunista. Suponhamos por exemplo que no Brasil o Partido Democrático estivesse no poder; suponhamos que os membros desse partido exilassem ou matassem todos os membros dos outros partidos como "contra-revolucionários"; poderíamos dizer que um cidadão sob tal regime era livre de afirmar a sua personalidade? E, no entanto, tal é a filosofia do Comunismo, onde há somente um partido, e esse partido é o governo. Necessariamente o homem tem de ser passivo sob um sistema que também afirma que as leis econômicas são as determinantes da cultura, e que não são as idéias, porém as mudanças de ferramentas, que determinam as mudanças de civilização.

Paralelo entre Cristianismo e Comunismo.
Note-se a diferença entre a visão Cristã e a visão Comunista do homem:
a) Para o Cristão, o homem é livre, porque a sua iniciativa vem de dentro, a saber, da sua alma. Ele pode ser comparado a um capitão de navio, que é livre de traçar o seu próprio curso e de escolher o seu próprio porto.
b) Para o Cristão, o homem é um sujeito. Um sujeito pode determinar suas ações, como o artista pode livremente pintar quaisquer pinturas que escolher.
c) Para o Cristão há duas espécies de unidade: unidade político-econômica, e unidade orgânico-espiritual, pela qual nós somos membros uns dos outros no Corpo Místico de Cristo.
d) Para o Cristão, o homem é um cidadão de dois mundos, e, em virtude do segundo, ele possui certos direitos inalienáveis, tais como a vida, a liberdade e a propriedade, dos quais nenhum Estado pode privá-lo.
e) Para o Cristão, o homem existe não somente no presente, mas também no futuro. A personalidade é independente do tempo, porque tem um valor intrínseco em todos os tempos.
f) Para o Cristão, o homem deve determinar a natureza da sociedade e ser o senhor desta.

a) Para o Comunista, o homem não é livre, porque a sua iniciativa vem de fora, i. é, do Partido, que dita não somente o que ele deverá fazer, mas também o que deverá pensar. Ele é como o leme de um navio, que vai para onde quer que o dirija o comandante, que é o ditador do Partido.
b) Para o Comunista, o homem é um objeto. Um objeto não pode agir, mas é acionado como um autômato social, e torna-se como o cinzel na mão de um escultor.
c) Para o Comunista, só há uma espécie de unidade — a unidade político-econômica, que é realizada não de dentro, por laços espirituais, mas de fora, pela força, pelo terror e pela propaganda.
d) Para o Comunista, o homem é cidadão de um só mundo, e, desde que o Estado é tudo, daí se segue que o homem não tem direitos salvo aqueles que o Estado lhe deu. Por conseguinte, quando o entender, pode o Estado tirar-lhe esses direitos.
e) Para o Comunista, a personalidade é relacionada ao tempo. O homem é alienado da sua humanidade no presente, para atingir uma humanidade duvidosa num paraíso terrestre no futuro. Tal como o expõe Lenine: "Durante o período da ditadura em que não haveria liberdade, o povo acostumar-se-ia às novas condições e sentir-se-ia livre numa sociedade comunista" (O Estado e a Revolução).
f) Para o Comunista, o homem é determinado pela sociedade, completamente absorvido e possuído por ela, e nela perde a sua identidade como uma gota de água perde a sua identidade num copo de vinho. Em vez de ser o senhor da sociedade, ele é o escravo dela.

Em resumo: O conceito cristão do homem é ativo — o homem é livre; o conceito comunista do homem é, necessariamente, passivo — o homem é um animal social obediente, cuja mais alta função é realizar o Piatiletka (Plano Qüinqüenal). Destarte sucede que o Comunismo, que começou por protestar contra a desumanidade do capitalismo, acabou por descapitalizar o capitalismo com a sua própria desumanidade. O homem, para o Comunismo, não é um espírito livre, uma personalidade, porém função de um processo social. O que é primário no Comunismo é o Partido, e o Partido controla o Estado. Criando uma opinião pública que ele representa como a única possível, o Estado Soviético torna impotente a vontade do indivíduo, e guia na direção que bem lhe aprouver a vontade, aparentemente espontânea e livre, das massas. Mesmo na nova Constituição proposta na Rússia, aos cidadãos não será permitido votar em diferentes partidos, mas somente em diferentes homens do mesmo partido. Que protesto não fariam os brasileiros se cada eleição fosse uma nomeação, e se eles só pudessem votar numa chapa! Como Troud, o órgão oficial dos operários soviéticos, o expõe: "A diferença essencial entre a existência de partidos no Mundo Ocidental e no nosso pais é a seguinte: um partido está no poder e todos os outros estão na prisão" (13 de Novembro de 1927). O Comunismo criou uma instituição especial para tornar o homem passivo ao Partido, e tão cruel foi a perversidade dela, que, por amor da opinião mundial,, julgou-se necessário mudar-lhe o nome de vez em quando; primeiramente foi a Cheka, depois a Ogpu, e agora é o Comissariado Interno. Em 1931, quando Lady Astor se encontrou com Stalin, perguntou-lhe à queima-roupa: "Por quanto tempo ainda vai o sr. continuar matando gente?" Apanhado desprevenido, Stalin respondeu: "Por tanto tempo quanto for necessário".

A subida de Stalin ao poder.
Mas poderíamos prosseguir, perguntando: necessário para quê? E a resposta seria: necessário para a vontade do Partido. E quem é a vontade do Partido? São os indivíduos que o controlam. As lutas aparentemente profissionais por trás de diferentes ideologias, na realidade, são apenas a capa de lutas pelo poder promovidas por diferentes indivíduos, sendo a vítima em cada caso o cidadão-títere. A luta entre os exilados Trotsky, Kamenev, Zinoviev (este último que concebeu a idéia de mumificar Lenine) e Stalin é uma triste história de ambição pessoal. Lenine, como deverá ser lembrado, declarou expressamente no seu testamento que Stalin era demasiado inclinado a concentrar o poder em suas mãos, para poder ser seu sucessor. Como foi que Stalin se tornou ditador, isto é a história de como Stalin mentiu a Trotsky sobre a data do funeral de Lenine, é a história de como ele foi bem sucedido, no Terceiro Congresso, em fazer que o testamento fosse lido perante uma comissão escolhida a dedo, e não no plenário; é por isto que o testamento de Lenine ainda não foi publicado na Rússia.

O verdadeiro ópio do povo.
Não há ópio pior do que aquele que adormece as personalidades de uma nação reduzindo-as ao estado de formigas que não têm direitos que o Estado seja obrigado a respeitar. Enquanto o direito do indivíduo de gozar de liberdade não for considerado como superior à vontade do Partido, e enquanto a verdade não significar alguma coisa mais do que aquilo que o Estado prescreve, e a falsidade alguma coisa mais do que aquilo que o Estado opõe; enquanto a justiça não significar mais do que a mantença de poder do Partido; enquanto a paz não significar mais do que uma ditadura de ferro; — o Comunismo deve estar preparado para ser chamado, o que na verdade é, o ópio do povo. E não o é somente tornando o homem passivo e inerte, é também martirizando-lhe a natureza, tentando quebrar o molde em que Deus o vazou e expulsar dele a humanidade pela força, como Pilatos, flagelando a Cristo, tentou expulsar dele a divindade.
Imaginando o Brasil sob o regime comunista.

Suponhamos por exemplo que no Brasil houvesse somente um partido; que esse partido se mantivesse no poder por meio da Polícia, do Exército e da Marinha; e que cada senador ou deputado que criticasse esse partido fosse exilado ou morto; suponhamos que o Presidente estabelecesse uma censura tal como existe na Rússia, e que todo livro que fosse publicado e todo jornal que fosse impresso e todo programa de teatro que fosse distribuído tivesse de glorificar o partido e de trazer o Imprimatur deste; suponhamos, além disso, que o Presidente controlasse toda estação de rádio e toda agência de informações, e não permitisse entrarem no Brasil livros ou revistas estrangeiras que criticassem o seu partido; e suponhamos que qualquer suspeita de falta de simpatia expusesse a pessoa à perda do seu emprego, e o fato de haver pertencido a um partido oposicionista condenasse a pessoa ao exílio; suponhamos que a polícia pudesse punir alguém sem processo; suponhamos que todas as nossas casas, fábricas, fazendas e terras fossem postas nas mãos do partido, para este fazer delas o que bem entendesse, e que as nossas igrejas fossem convertidas em celeiros e museus — suponhamos todas estas coisas como acontecendo aqui no Brasil e teremos uma pintura do que sucedeu na Rússia. E, se eu vos perguntasse o que deveria acontecer-vos antes de renderdes a vossa atual liberdade e independência — vós diríeis que primeiramente teríeis de ser prostrados inconscientes. Foi isso justamente o que o Comunismo fez na Rússia com a sua propaganda — prostrou-os na inconsciência.

Que é o ópio? É uma droga que amortece as potências intelectuais do homem, mas deixa continuarem as suas funções animais e vegetativas. Um homem sob a influência dele não pode pensar, mas pode digerir; não pode querer, mas ainda pode respirar. Por outras palavras, é como um animal e não como um homem.

Ora, qual dos dois merece ser chamado ópio — a religião ou o Comunismo? A religião pede intelecto; começa pedindo ao homem usar a sua razão para descobrir o grande Legislador por trás da lei, o grande Pensador por trás de todo pensamento, a Beleza Perfeita por trás de toda poesia. Feito isto, pede à razão estabelecer critérios científicos para julgar a possibilidade de haver-se Deus alguma vez revelado a nós de qualquer outro modo que não pela sua atividade criadora; e, uma vez estabelecidos estes critérios, aplica-os Àquele que apareceu na terra e pretendeu ser o Criador do mundo. Só depois que esse Pretendente provou a sua Divindade por coisas divinas, racionalmente reconhecíveis, é que o intelecto opera a sua submissão à verdade d'Ele. Depois, pegando do telescópio da fé, que não destrói a razão como o telescópio material não destrói o olho, ele entra em comunicação com outros mundos com que a razão nunca sonhou. Isso é a religião — e uma religião assim pede que o homem conserve bem viva a sua razão.

Porém o Comunismo adormece a razão; diz ao homem que não procure uma causa para este mundo, que não se admire de que a gente tenha medo de morrer, que não pergunte por que é que uma ação má enche de remorso a consciência, e uma ação boa a enche de paz. Diz ao homem que tudo o de que ele precisa para ser um cidadão no Estado Comunista é ter um estômago e duas mãos; por outras palavras, é ser um animal econômico a amontoar riqueza para o Estado, e depois morrer, como uma besta, mesmo sem ter um Zinoviev para o mumificar. Todo regime que faz isto a seres humanos está-lhes negando aquilo que os diferencia dos animais, e está criando uma nova escravidão em que a mente e a vontade são atadas com grilhões — escravidão mil vezes mais amarga do que a escravidão do corpo. Os governos do mundo estão gradualmente fechando o cerco àqueles que traficam em narcóticos e drogas; e muito breve os povos inteligentes do mundo atentarão sobre o mal feito pelo ópio que vem da Rússia e da propaganda comunista. Esse ópio já arruinou milhões de pessoas na Rússia, mas não se deve permitir que arruíne o mundo.

A guerra do Comunismo contra a religião.
A guerra do Comunismo contra a religião continuará — não num plano intelectual, mas num plano muscular e militar, ou seja no plano da força. Eles não podem atacar inteligentemente a religião. Eles nunca conseguiram sequer o direito de discutir sobre ela, porque nada conhecem dela. Resta, pois, perguntar que fará a força deles? Botarão Deus para fora do céu? Acaso a sua violência esvaziará dos anjos o céu? A resposta é: Não! Eles apenas deixarão devastada a terra.

Vimo-los proscreverem a religião na Rússia, desterrarem o seu clero e matarem o seu povo; vimo-los fecharem as igrejas do México; vimo-los crucificarem padres na Espanha, abrirem os túmulos de Religiosas e espalhar-lhes os restos diante das portas da catedral. Vimos os seus museus anti-religiosos; lemos a sua literatura anti-Deus; mas tudo o que os vimos e ouvimos fazer e dizer contra a religião não nos convenceu de que não há Deus. Eles apenas nos convenceram de que há Demônio!
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Comunismo: Ópio do Povo (Mons. Fulton Sheen)
EDITORA VOZES Ltda., PETRÓPOLIS, R. J.
RIO DE JANEIRO — SÃO PAULO - 1952

A efemeridade da vida.

As pessoas envelhecem. Ontem eu era uma menina, hoje sou uma senhora. Ontem minha mãe era uma senhora, e eu me recordo do seu rosto quando ela tinha a minha idade, como me recordo do meu rosto quando eu tinha a idade do meu filho. Hoje minha mãe é uma idosa. Amanhã serei idosa, como ela.

E assim como nós envelhecemos, já repararam como a nossa casa também envelhece? Casa de avó tem mobílias antigas, panelas e louças velhas, bordados do tempo do rococó. Aquela casa linda da minha amiga, casa novinha que visitei anos atrás, hoje é uma casa antiga. Possui aquele mesmo jeito, aquela mesma personalidade, mas é antiga, tem décadas de história. Ainda que ela mude a pintura ou faça alguma reforma, continuará sendo uma casa antiga, como a minha.

Aquele relógio que eu comprei para durar - e está durando - já está ultrapassado. Como o da minha mãe. Mas eu gosto dele, funciona tão bem! Relógio de vovó. Já a minha filha compra relógios que não duram. Tem vários deles, para usar conforme a ocasião. Eu só tenho um.

Aqueles bordados que a minha mãe guarda com tanto zelo numa caixa, eu também os tenho. Os dela estão amarelados; os meus, amarelando.

Aquele casaco que minha mãe só usa em dias de muito frio está lá, no seu guarda-roupas. O meu também está aqui. É aquele mesmo casaco, o casado da vovó. Eu não era vovó quando o comprei. Hoje sou, e ainda o uso.

Sou do tempo em que as coisas duravam. Os móveis, as roupas, as panelas, os calçados, as mobílias, os relacionamentos.

Levávamos sapatos ao sapateiro, relógios ao relojoeiro, roupas às costureiras, panelas ao paneleiro, havia conserto para tudo, até para o casamento. As pessoas se casavam, compravam uma casa e viviam nela até o fim. Era assim. Vinham os filhos, vinham os netos... e a casa estava ali, sempre pronta para abrigar aquela família. Os netos, saboreando os doces da vovó, aquele mesmo doce que aprendi a fazer com minha mãe.

As coisas duravam o tempo de uma vida. Envelheciam conosco. Como as construções, como as máquinas, como os casamentos, como as amizades. Se estragassem, sempre havia conserto. Eu tenho uma máquina de escrever de 1940 que era do meu pai, e funciona perfeitamente. Mas não tenho mais o computador que comprei há três anos, está ultrapassado. Os novos programas não rodam nele.

As coisas não se desfaziam, não se corrompiam com o tempo. A palavra dada tinha valor, a integridade e a honestidade eram virtudes. Uma costureira não fazia um vestido mal feito, um trabalho qualquer não ficava pela metade. A gente podia acreditar nas pessoas. Não havia Código de Direito do Consumidor, mas a palavra dada, a honradez, a satisfação do dever cumprido. Tudo era feito para durar, pelo menos o tempo de uma vida.

Entre todas as coisas que existem, tudo envelhece e um dia se acaba. Mas eu encontrei uma que não envelhece nunca, e vocês haverão de concordar comigo: as igrejas. Por mais antigas que sejam, são sempre novas. Por mais que os bancos tenham mais de 300 anos, por mais que as pinturas sejam milenares, as igrejas são sempre impecáveis, sempre novas.  A mesma igreja onde minha mãe rezou, eu rezo, minha filha reza, meus netos rezam, meus bisnetos rezarão. Ali encontramos algo que está além do Tempo: a eternidade. Isto enquanto forem igrejas. Se forem vendidas e tornarem-se bares ou hotéis, envelhecerão, como tudo nesta vida.

A PIEDADE: Santo Tomás e o método aristotélico

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Por Anatoli Oliynik

            Para alguns a leitura da Suma Teológica de Santo Tomás de Aquino (1225-1274), um dos trinta e três doutores da Igreja, torna-se densa e incompreensível. Densa, de fato ela é, exige certo esforço para sua compreensão porque não se trata de leitura elementar ou de diversão, mas de leitura analítica de um dos maiores tratados já escritos por mãos humanas.
            Acredito que uma das dificuldades para o leitor desta obra seja a não compreensão da estrutura do método aplicado por Santo Tomás nesta obra. O que pretendo neste despretensioso artigo é puxar uma ponta do véu que encobre o palco, na expectativa que o descortino seja útil e ajude o leitor interessado no assunto. Para isso, escolhi aleatoriamente um assunto constante na obra magna de Santo Tomás onde faço breves comentários de esclarecimento relativos ao método. Vamos e eles.

A PIEDADE[i]
Questão 101
em quatro artigos
“Depois da religião, deve-se considerar a piedade. Este estudo nos mostrará com clareza os vícios que lhe são opostos.
Sobre a piedade quatro questões:
1.      A quem se estende a piedade?
2.       O que a piedade assegura a alguns?
3.       A piedade é uma virtude especial?
4.       Será lícito invocar a religião para omitir os deveres da piedade?”
Nesta transcrição vou considerar tão somente a primeira questão “A quem se estende a piedade”. Dois são os objetivos a serem alcançados:
O primeiro, demonstrar o Método Dialético de Aristóteles (método da confrontação dos contrários) utilizado por Santo Tomás de Aquino na Suma Teológica de onde extraí o tema “Piedade”.
O segundo, é levar ao conhecimento daqueles que nunca leram a Suma Teológica o quão importante é estudar Santo Tomás de Aquino, o maior filósofo escolástico ao lado de Duns Scot, embora ambos atuassem em campos diferentes.
No Método Dialético a questão é colocada como uma pergunta (dilema, problema), em seguida são enunciadas varias respostas conhecidas e concebidas mais algumas possíveis; na sequência arbitradas dialeticamente e por fim a conclusão das respostas e das objeções. Esta é, ainda hoje, a estrutura da investigação científica.
Continuemos, pois, à transcrição do texto de Santo Tomás.
Artigo 1
A piedade se estende a algumas pessoas determinadas?
Quanto ao primeiro artigo, assim se procede: parece que a piedade não se estende a certas pessoas determinadas.”
            Observe-se que Santo Tomás faz o enunciado com uma negação. Nem sempre é assim. Aleatoriamente ele pode começar com uma negação, como neste caso, ou como uma afirmação.
A seguir, Santo Tomás apresenta três respostas conhecidas:
            1. Com efeito, Agostinho diz: “Por piedade se costuma entender, no sentido próprio, o culto de Deus que os Gregos chamam de eusebéia.” Ora, o culto de Deus não se refere à relação com os homens, mas exclusivamente à relação com Deus. Logo, a piedade não se estende de maneira determinada a nenhum tipo de pessoa humana.
            2. Além disso, Gregório diz: “A piedade oferece seu banquete no seu dia, porque ela enche as entranhas do coração com obras de misericórdia”. Ora, segundo Agostinho, as obras de misericórdia devem ser prestadas a todos. Logo, a piedade não se estende a certas pessoas determinadas.
            3. Ademais, no trato com os homens existem inúmeros outros tipos de relação, afora a consangüinidade e a concidadania, como o mostra o Filósofo[1]. Cada um desses tipos de relação fundamenta certa amizade que parece ser a virtude da piedade, como diz a Glosa sobre texto de Paulo: “tendo as aparências de piedade...”. Logo, a piedade não se estende apenas aos nossos parentes e concidadãos”.
            Agora Santo Tomás apresenta uma objeção:
            Em sentido contrário, Túlio declara: “A piedade é a virtude pela qual se presta um obsequioso respeito aos consanguíneos e amigos da pátria”.
            Enfim, a conclusão:
            Respondo: O homem se torna devedor de outras pessoas, de diferentes maneiras, segundo os diferentes graus de excelência que estas pessoas possuem e segundo os diferentes benefícios que delas tiver recebido. Em ambos os planos, Deus ocupa o primeiríssimo lugar, pelo fato de ser o mais excelente, e de, ser para nós o primeiro princípio de existir e de governo. Mas nossos pais e nossa pátria, dos quais recebemos vida e subsistência, merecem também, embora de modo secundário, este título de princípio de existir e de governo. É por isto que depois de Deus, o homem é o máximo devedor dos pais e da pátria. Conseqüentemente, assim como cabe à religião prestar culto a Deus, assim também, em grau inferior, pertence à piedade render culto aos pais e à pátria. Por outro lado, no culto dos pais se inclui o culto a todos os consanguíneos que são chamados porque procedem dos mesmos pais, como o demonstra o Filósofo. E no culto à pátria está incluído o culto a todos os concidadãos e a todos os amigos da pátria. É por isso que a piedade se estende a todos estes de maneira prioritária. (grifo meu)
            Quanto ao 1º, portanto, deve-se dizer que o mais inclui o menos. Por essa razão, o culto devido a Deus inclui em si mesmo, como algo particular, o culto que se deve aos pais. Daí esta palavra que se encontram em Malaquias: “Se eu sou Pai, onde [está] a honra que me é devida?” Por conseguinte o termo piedade pode se referir também ao culto divino. (grifos meu)
            Quanto ao 2º, deve-se dizer que, como diz Agostinho: “A palavra piedade é empregada pelo povo também para designar as obras de misericórdia. A meu ver, esse sentido provém do fato que Deus recomenda estas obras de um modo todo especial, chegando até a declarar que elas lhe são mais agradáveis que os sacrifícios. Este costume nos levou a dar ao próprio Deus o nome de piedoso”.
            Quanto ao 3º, deve-se dizer que as relações de consangüinidade e de concidadania mais se referem aos princípios de nosso existir mais do que outro tipo de relacionamento. Por isso a elas mais se estende o nome de piedade.
            Espero que estas informações possam ajudar o leitor a compreender o método aristotélico e, ao mesmo tempo se interessar pela obra caso dela não tenha conhecimento.

FONTE:
Fonte: Suma Teológica – Volume VI, II-II Parte - Questões 57-112, págs. 529-31.


[1] O Filósofo que Santo Tomás de Aquino se refere é Aristóteles.



[i] A piedade se apresenta como a primeira das virtudes sociais, que formam com a religião a constelação de virtudes anexas da justiça. O estudo da religião se abria à consideração dessa forma superior de justiça que presta a Deus a homenagem do culto divino, prolongando-se na orientação de toda a existência humana através das disposições de adoração, de dependência e de reconhecimento em relação ao Criador.