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sábado, 23 de abril de 2011

Papa responde perguntas em programa de televisão (22/04/11)

CIDADE DO VATICANO, sexta-feira, 22 de abril de 2011 (ZENIT.org) – Quem não gostaria de conversar alguns minutos com o Papa e expressar-lhe as inquietudes do seu coração? Hoje, algumas pessoas – selecionadas entre mais de duas mil – tiveram esta oportunidade e fizeram várias perguntas a Bento XVI.

A emissora de televisão italiana ‘RaiUno’ convidou o Santo Padre para participar de um de seus programas, “A sua immagine” (“À sua imagem”), respondendo a perguntas dos telespectadores. O programa foi ao ar nesta Sexta-Feira Santa e os principais temas abordados foram o sofrimento, a perseguição dos cristãos, a paz e a paixão, morte e ressurreição de Jesus.

A primeira pergunta foi feita por uma menina japonesa de 7 anos que, diante do terror vivido em seu país devido aos terremotos, disse ao Papa: “Tenho muito medo, porque a casa na qual eu me sentia segura tremeu muito e porque muitas crianças da minha idade morreram. (...) Por que tenho de passar por tanto medo? Por que as crianças têm de sofrer tanta tristeza?”.
Bento XVI reconheceu que “não temos uma resposta, mas sabemos que Jesus sofreu como vocês, inocentes”, e recomendou: “Neste momento, parece-me importante que saibam que ‘Deus me ama’, ainda que pareça que Ele não me conhece”.
Recordando também a solidariedade e a ajuda oferecida por pessoas do mundo inteiro, o Santo Padre lembrou que “um dia, eu compreenderei que este sofrimento não era uma coisa vazia, não era inútil, mas que, por trás do sofrimento, há um projeto bom, um projeto de amor. Não é por acaso”.

A segunda pergunta foi feita por uma mulher italiana cujo filho está em estado vegetativo há um ano: “Santidade, a alma do meu filho abandonou seu corpo - visto que ele está totalmente inconsciente - ou ainda está nele?”. O Papa respondeu que a alma ainda está presente no corpo e fez uma comparação: “A situação é semelhante à de um violão que tem as cordas quebradas e que não pode ser tocado: assim também o instrumento do corpo é frágil, vulnerável, e a alma não pode tocar, por assim dizer, mas continua presente”.
“Sua presença, queridos pais, é um testemunho de fé em Deus, de fé no homem, de compromisso a favor da vida, de respeito pela vida humana, inclusive nas situações mais trágicas”, recordou.

Um grupo de jovens de Bagdá se dirigiu a Bento XVI para falar sobre a perseguição dos cristãos no Iraque: “De que maneira podemos ajudar nossa comunidade cristã, para que reconsidere o desejo de emigrar a outros países, convencendo-a de que ir embora não é a única solução?”. Renovando seu apoio aos cristãos e muçulmanos do país, o Santo Padre afirmou que o verdadeiro problema é que “a sociedade está profundamente dividida, lacerada” e que é preciso “reconstruir esta consciência de que, na diversidade, todos têm uma história comum, uma comum determinação”.

Também uma mulher muçulmana, da Costa do Marfim, falou da situação política do seu país, que está causando divisão entre cristãos e muçulmanos, e perguntou: “O senhor, como embaixador de Jesus, o que aconselharia ao nosso país?”. O Papa recordou a importância de orar pela população e mencionou ações concretas da Santa Sé: “Pedi ao cardeal Tuckson, que é presidente do nosso Conselho Justiça e Paz, que vá à Costa do Marfim e tente mediar, falar com os diversos grupos, com diferentes pessoas, para facilitar um novo começo”. E lembrou da necessidade de ouvir a voz de Jesus, “em quem vocês também acreditam como profeta. Ele era sempre o homem da paz”.
“O único caminho é a renúncia à violência, recomeçar o diálogo, as tentativas de encontrar juntos a paz, uma nova atenção de uns aos outros, a nova disponibilidade a abrir-se uns aos outros. E esta, querida senhora, é a verdadeira mensagem de Jesus: busquem a paz com os meios da paz e abandonem a violência”, afirmou.

A seguinte pergunta veio da Itália: “O que Jesus fez no lapso de tempo entre a morte e a ressurreição? E, já que no Credo se diz que Jesus, depois da morte, desceu ao inferno, podemos pensar que isso é algo que acontecerá conosco também, depois da morte, antes de ascender ao céu?”.
O Papa Ratzinger explicou que “este descenso da alma de Jesus não deve ser imaginado como uma viagem geográfica, local, de um continente a outro. É uma viagem da alma. É preciso levar em consideração que a alma de Jesus sempre toca o Pai, está sempre em contato com o Pai, mas, ao mesmo tempo, esta alma humana se estende até os últimos confins do ser humano. Neste sentido, desce às profundezas, vai até os perdidos, dirige-se a todos aqueles que não alcançaram a meta das suas vidas”.
“Esta palavra da descida do Senhor aos infernos significa, sobretudo, que Jesus alcança também o passado; que a eficácia da redenção não começa no ano zero ou no ano trinta, mas que chega ao passado, abrange o passado, todas as pessoas de todos os tempos”, acrescentou.
Com relação ao destino da alma humana, afirmou que “nossa vida é diferente: o Senhor já nos redimiu e nos apresentaremos ao Juiz, depois da nossa morte, sob o olhar de Jesus, e este olhar em parte será purificador; acho que todos nós, em maior ou medida, precisaremos ser purificados”.

Outra pergunta, vinda da Itália, também tratou do tema da ressurreição de Jesus: “O fato que de seu corpo ressuscitado não tenha as mesmas características de antes, o que significa? O que significa, exatamente, ‘corpo glorioso’? E a ressurreição, será assim também para nós?”.
“Naturalmente – disse Bento XVI –, não podemos definir o corpo glorioso, porque esta além da nossa experiência. Só podemos interpretar alguns dos sinais que Jesus nos deu para entender, ao menos um pouco, para onde esta realidade aponta.” Entre esses sinais, o Pontífice mencionou o sepulcro vazio, que indica que Jesus não abandonou seu corpo à corrupção: “Jesus assumiu também a matéria, razão pela qual a matéria também está destinada à eternidade”. Acrescentou que Cristo “assumiu esta matéria em uma nova forma de vida: Jesus não morre mais, ou seja, está muito além das leis da biologia, da física, porque os submetidos a elas morrem. (...) É uma vida nova, que já não está sujeita à morte, e essa é a nossa grande promessa”.
O Papa recordou que, na Eucaristia, Cristo nos dá seu corpo glorioso: “Assim, já estamos em contato com esta nova vida, este novo tipo de vida, já que Ele entrou em mim, e eu saí de mim e me estendo até uma nova dimensão da vida. Acho que este aspecto da promessa, da realidade de que Ele se entrega a mim e me faz sair de mim mesmo e me eleva, é a questão mais importante: não se trata de decifrar coisas que não podemos entender, mas de encaminhar-nos rumo à novidade que começa, sempre, de novo, na Eucaristia”.

A última pergunta foi sobre as palavras dirigidas por Jesus a Maria e a João aos pés da cruz: “Eis aqui o teu filho”, “Eis aqui a tua mãe” - que Bento XVI definiu, em seu último livro, como “uma disposição final de Jesus”. “Como devemos entender estas palavras? Que significado tinham naquele momento e que significado têm hoje em dia?”
O Santo Padre respondeu que “estas palavras de Jesus são, antes de mais nada, um ato muito humano. Vemos Jesus como um homem verdadeiro que leva a cabo um gesto de verdadeiro homem: um ato de amor por sua mãe, confiando-a ao jovem João, para que estivesse segura”. Por outro lado, explica que, “certamente, este gesto tem várias dimensões, não diz respeito apenas a esse momento: concerne a toda a história. Em João, Jesus confia todos nós, toda a Igreja, todos os futuros discípulos, à sua Mãe, e sua Mãe a nós”.
Além disso, acrescentou, “a Mãe é também expressão da Igreja. Não podemos ser cristãos sozinhos, com um cristianismo construído segundo as minhas ideias. A Mãe é imagem da Igreja, da Mãe Igreja e, confiando-nos a Maria, também temos de confiar-nos à Igreja, viver a Igreja, ser Igreja com Maria”.

O programa “A sua imagem” durou cerca de uma hora e meia e Bento XVI acompanhou sua emissão da sua biblioteca, no Palácio Apostólico vaticano.

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sexta-feira, 22 de abril de 2011

Pela tua Paixão, Senhor!

Pela tua Paixão, Senhor,
tem piedade de nós!


Porque queremos ser amados, ser queridos pelos outros,
mas nossa alma sofre as misérias do ódio, da vingança e da ira.
Porque pensamos apenas em nós mesmos,
nas coisas e pessoas que nos incomodam no dia-a-dia
e não exercemos a tua vontade em nós.
Porque falamos sempre da paz, queremos viver a paz,
mas espalhamos continuamente a discórdia e o desamor.
Porque queremos a verdade,
mas vivemos na mentira, na hipocrisia.
Porque queremos ser ouvidos, ser compreendidos e aceitos,
mas nunca sabemos o que sofre o outro.
Porque queremos impor aos outros a nossa maneira de ver as coisas,
mas não percebemos que estamos com os olhos vendados.
Porque somos sábios para julgar e condenar,
mas não vemos os nossos próprios defeitos.
Porque queremos ensinar a integridade
e não percebemos que estamos despedaçados.
Porque a nossa consciência está perturbada
pelo peso dos nossos pecados.
Porque não entendemos o que significa a tua Paixão
e a tua morte na Cruz nada altera o nosso modo de viver.
Porque utilizamos a tua justiça para acusar,
mas esquecemos que a tua misericórdia perdoa e acolhe.
Porque sustentamos a tua palavra na superfície de nossos sentidos
e não permitimos que ela mergulhe em nossos corações.
Porque a mesma boca que te recebe e te louva
proclama palavras de ódio e violência.
Porque em nosso rosto não resplandece a tua face.
Porque não somos uma extensão da tua presença,
um caminho para a tua graça,
um viático de amor,
Senhor, tem piedade de nós!
Abre os nossos olhos e faz-nos ver, por um momento de graça,
que o teu sangue derramado na Cruz por nós
não foi em vão! 

por Raquel Nascimento Pereira

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quinta-feira, 21 de abril de 2011

MLAGRES EUCARÍSTICOS NO MUNDO


A Hóstia Consagrada  É o Corpo e o Sangue de Jesus Cristo.
Quando Ele disse: "Tomai e comei, isto é o meu Corpo;
tomai e bebei, isto é o meu Sangue: fazei isso em memória de mim",
quis nos dar a Si mesmo em comida e bebida.
É esta Eucaristia, recebida com fé e devoção,
que nos faz trilhar o caminho certo, sem sombras de erros.
Quando dizemos que "Jesus Cristo caminha conosco", CAMINHA MESMO!
Por mais que não sejamos merecedores de tal Presença, Ele quis assim.
Deu a Sua vida por nós, na Cruz, e quis ser o nosso Alimento Espiritual.
Ninguém estaria apto a recebê-la. Mas Ele nos faz aptos, através dos Sacramentos
do Batismo, da Comunhão e da Confissão. Quem pode entender isso?
A mente humana não pode compreender. A razão não pode explicar.
Só quem vive sob a luz desses Sacramentos pode dizer, como Paulo disse:
"Não sou eu que vivo, mas Cristo vive em mim!"
Pois fazemos coisas que jamais faríamos, temos idéias que jamais teríamos,
andamos por caminhos que jamais andaríamos, perdoamos como jamais perdoaríamos,
amamos como jamais amaríamos, se não fosse a Presença real de Cristo em nós,
Ele, o nosso Inspirador.
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domingo, 17 de abril de 2011

A CONSCIÊNCIA E A VIDA CORRETA - Joseph Ratzinger

Seguir a consciência significa realizar todos os nossos gostos? O conceito de autoridade exclui o conceito de liberdade? O então Cardeal Ratzinger fala sobre essas e outras questões nesse conjunto de reflexões tirado do posfácio do livro Joseph Ratzinger: uma biografia.
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A unidade do homem tem um órgão: a consciência. Foi uma ousadia de São Paulo afirmar que todos os homens têm a capacidade de escutar a sua consciência, separando assim a questão da salvação da questão do conhecimento e da observância da Torah e situando-a no terreno da comum exigência da consciência em que o Deus único fala e diz a cada um o que é verdadeiramente essencial na Torah: Quando os gentios, que não têm lei, cumprem naturalmente as prescrições da lei, sem ter lei são lei para si mesmos, demonstrando que têm a realidade dessa lei escrita no seu coração, segundo o testemunho da sua consciência... (Rom 2, 14 e segs.). Paulo não diz: “Se os gentios se mantiverem firmes na sua religião, isso é bom diante do juízo de Deus”. Pelo contrário, ele condena grande parte das práticas religiosas daquele tempo. Remete para outra fonte, para aquela que todos trazem escrita no coração, ao único bem do único Deus.

Seja como for, aqui se enfrentam hoje dois conceitos contrários de consciência, que na maioria das vezes simplesmente se intrometem um no outro. Para Paulo, a consciência é o órgão da transparência do único Deus em todos os homens, que são um homem. Em contrapartida, atualmente a consciência aparece como expressão do caráter absoluto do sujeito, acima do qual não pode haver, no campo moral, nenhuma instância superior. O bem como tal não seria cognoscível. O Deus único não seria cognoscível. No que diz respeito à moral e à religião, a última instância seria o sujeito.

Isto seria lógico, se a verdade como tal fosse inacessível. Assim, o conceito moderno da consciência equivale à canonização do relativismo, da impossibilidade de haver normas morais e religiosas comuns, ao passo que, pelo contrário, para Paulo e para a tradição cristã, a consciência sempre foi a garantia da unidade do ser humano e da cognoscibilidade de Deus, e assim da obrigatoriedade comum de um mesmo e único bem. O fato de que em todos os tempos houve e há santos pagãos baseia-se em que em todos os lugares e em todos os tempos – embora muitas vezes com grande esforço e apenas parcialmente – a voz do coração era perceptível; a Torah de Deus se nos fazia perceptível como obrigação dentro de nós mesmos, no nosso ser criatural, e assim tornava possível que superássemos a mera subjetividade na relação de uns com os outros e na relação com Deus. E isto é a salvação (1).

CONSCIÊNCIA E VERDADE

A vida e a obra do Cardeal Newman poderia ser realmente definida como um extraordinário e extenso comentário ao problema da consciência <...>. Quem não se recorda <...> da famosa frase acerca da consciência na carta que dirigiu ao duque de Norfolk? Diz assim: “Se tivesse de brindar pela religião, o que é altamente improvável, fá-lo-ia pelo Papa. Mas em primeiro lugar pela consciência. Só depois o faria pelo Papa” (2). Newman queria que a sua resposta fosse uma adesão clara ao Papado em face da contestação de Gladstone, mas também queria que fosse, em face das formas errôneas do “ultramontanismo”, uma interpretação do Papado que só pode ser concebido adequadamente quando visto de forma conjunta com o primado da consciência, não como oposto a ela, mas como algo que a funda e lhe dá garantia. É difícil para o homem moderno, que pensa sempre na subjetividade como oposta à autoridade, entender esse problema. Para ele, a consciência está do lado da subjetividade e é expressão da liberdade do sujeito, enquanto a autoridade aparece como sua limitação e, inclusive, como sua ameaça e negação. É preciso aprofundar mais em tudo isso para entender de novo a perspectiva em que tal oposição não é válida.

O conceito central de que Newman se serve para unir autoridade e subjetividade é a verdade. Não tenho reparos em dizer que a verdade é a idéia central da sua luta espiritual. A consciência ocupa para ele um lugar central porque a verdade está no centro. Dito de outra maneira: em Newman, a importância do conceito de consciência está unida à excelência do conceito de verdade e deve ser entendida exclusivamente a partir dele. A presença constante da idéia de consciência não significa a defesa, no século XIX e em contraposição à neo-escolástica “objetivista”, de uma filosofia ou uma teologia da subjetividade. O sujeito merece, a seu ver, uma atenção como não havia despertado talvez desde Santo Agostinho. Mas é uma atenção na linha de Santo Agostinho, não na da filosofia subjetivista da modernidade. Ao ser elevado ao cardinalato, Newman confessou que toda a sua vida tinha sido uma luta contra o liberalismo. Poderíamos acrescentar: e também contra o subjetivismo cristão tal como o encontrou no movimento evangélico do seu tempo, e que constituiu o primeiro degrau de um caminho de conversão que duraria toda a sua vida.

A consciência não significa para Newman a norma do sujeito frente às demandas da autoridade num mundo sem verdade, que vive entre as exigências do sujeito e da ordem social, mas, antes, a presença clara e imperiosa da voz da verdade no sujeito. A consciência é a anulação da mera subjetividade no ponto em que se tangenciam a intimidade do homem e a verdade de Deus. São significativos os versos que escreveu na Sicília em 1833: “Eu amava o meu próprio caminho. Agora Te peço, ilumina-me para Te seguir” (3). A conversão ao catolicismo não foi para ele uma questão de gosto pessoal ou de uma necessidade anímica subjetiva. Já em 1844, no umbral de sua conversão, falava sobre isso com estas palavras: “Ninguém pode ter uma opinião mais desfavorável que eu da situação atual dos católicos” (4). Mas a Newman importava mais obedecer à verdade, inclusive contra o seu próprio sentir, que seguir o seu gosto, os vínculos de amizade e os caminhos trilhados.

Parece-me muito significativo que ele tenha sublinhado a prioridade da verdade sobre o bem na série das virtudes, ou, expresso de forma mais compreensível para nós, a sua primazia em face do consenso e dos pactos de grupo. Eu diria que essas atitudes são comuns quando falamos de um homem de consciência. Homem de consciência é aquele que não compra tolerância, bem-estar, êxito, reputação e aprovação públicas renunciando à verdade. Nisso Newman coincide com outra grande testemunha britânica da consciência, com Thomas More, para quem a consciência nunca foi expressão da sua vontade de obstinação nem de heroísmo caprichoso. Thomas More contava-se a si mesmo entre os mártires temerosos que só depois de muitos atrasos e inumeráveis questionamentos conseguiu levar a alma a obedecer à consciência: a obediência à verdade, que deve estar acima das instâncias sociais e dos gostos pessoais. Aparecem então dois critérios para distinguir a presença de uma verdadeira voz da consciência: que não coincida com os desejos e gostos próprios nem com o que é mais benéfico para a sociedade, o consenso do grupo ou as exigências do poder político ou social.

Chegados a este ponto, parece natural lançar um olhar aos problemas da nossa época. O indivíduo não deve trair a verdade reconhecida para comprar o progresso e o bem-estar. A humanidade não o permite. Com isto, tocamos o ponto verdadeiramente crítico da modernidade: o conceito de verdade foi praticamente abandonado e substituído pelo de progresso. O progresso “é” a verdade. Mas com essa aparente elevação desmente-se e anula a si próprio, pois quando não há direção, o mesmo movimento pode ser tanto progressivo como retrógrado. É assim que a teoria da relatividade formulada por Einstein vê o cosmos físico. Mas penso que também descreve com acerto a situação do cosmos espiritual do nosso tempo. A teoria da relatividade estabelece que não há nenhum sistema de referência fixo; cabe a nós considerar um ponto qualquer como referência e a partir dele tentar medir a totalidade, pois apenas assim poderemos obter resultados; da mesma maneira que escolhemos um, poderíamos ter escolhido qualquer outro.

O que se diz a respeito do cosmos físico reflete também o segundo giro “copernicano” que se deu na nossa relação fundamental com a realidade: a verdade, o absoluto, o ponto de referência do pensamento deixou de ser evidente. Por isso, já não há – tampouco do ponto de vista espiritual – nem norte nem sul. Não há direção num mundo sem pontos de medida fixos. O que consideramos direção não assenta numa medida verdadeira, mas numa decisão nossa e, em última análise, no ponto de vista da utilidade. Num tal contexto “relativista”, a ética teleológica ou conseqüencialista converte-se numa ética niilista, mesmo quando não se percebe. O que numa cosmovisão como essa se chama “consciência” é, considerada em profundidade, um modo de dissimular que não há autêntica consciência, isto é, unidade de conhecimento e verdade. Cada um cria os seus próprios critérios, e, na situação de relatividade geral, ninguém pode ajudar os outros, e menos ainda dar-lhes instruções.

Agora se percebe a enorme radicalidade do debate ético atual, cujo centro é a consciência. Penso que o paralelismo mais aproximado na história das idéias é a controvérsia entre Sócrates e Platão, por um lado, e os sofistas, por outro, na qual se põe à prova a resolução originária de duas atitudes fundamentais: a confiança na capacidade humana de verdade e uma visão do mundo na qual o homem cria os seus próprios critérios.

O motivo pelo qual Sócrates, um pagão, se converteu em certo sentido num profeta de Jesus Cristo é, a meu ver, essa questão primordial: a sua disposição de acolher a verdade foi o que permitiu ao modo de fazer filosofia inspirado na sua figura o privilégio de ser de algum modo um elemento da História Sagrada, e o que fez dele um recipiente idôneo do Logos cristão, cuja finalidade é a libertação pela verdade e para a verdade. Se separarmos a luta de Sócrates das contingências históricas do momento, perceberemos rapidamente com que intensidade intervém – com outros argumentos e nomes – nos assuntos da polêmica do presente. <...>

Em muitos lugares já não se pergunta o quê um homem qualquer pensa. Basta-nos dispor de uma idéia sobre o seu modo de pensar para incluí-lo na categoria formal conveniente: conservador, reacionário, fundamentalista, progressista ou revolucionário. A inclusão num esquema formal torna desnecessária qualquer explicação do seu pensamento. Algo parecido, mas reforçado, se observa na arte. O que expressa é indiferente: pode glorificar Deus ou o diabo. O único critério é que seja formalmente conhecido.

Com isto, chegamos ao verdadeiro núcleo do nosso assunto. Quando os conteúdos não contam e a pura fraseologia assume o comando, o poder converte-se em critério supremo, isto é, transforma-se em categoria – revolucionária ou reacionária – dona de tudo. Esta é a forma perversa de semelhança com Deus de que fala o relato do pecado original. O caminho do mero poder e da pura força é a imitação de um ídolo, não a realização da imagem de Deus. O traço essencial do homem enquanto homem não é perguntar pelo poder, mas pelo dever, e abrir-se à voz da verdade e suas exigências. Esta é, a meu ver, a trama definitiva da luta de Sócrates. Também é o argumento mais profundo do testemunho dos mártires: os mártires manifestam a capacidade de verdade do homem como limite de qualquer poder e como garantia da sua semelhança com Deus. É assim que os mártires se constituem nas grandes testemunhas da consciência, da capacidade outorgada ao homem para perceber o dever acima do poder e começar o progresso verdadeiro e a ascensão efetiva (5).

A CONSCIÊNCIA “INFALÍVEL”

A consciência é apresentada como o baluarte da liberdade em face das constrições da existência causadas pela autoridade. <...> Desse modo, a moral da consciência e a moral da autoridade parecem enfrentar-se como duas morais contrapostas em luta recíproca. A liberdade do cristão ficaria a salvo graças ao postulado original da tradição moral: a consciência é a norma suprema que o homem deve seguir sempre, mesmo quando vai contra a autoridade. Quando a autoridade, nesse caso o Magistério da Igreja, falasse sobre problemas de moral, estaria submetendo um material à consciência, que reservaria sempre para si mesma a última palavra <...>. Essa concepção da consciência como última instância é recolhida por alguns autores na fórmula “a consciência é infalível”. <...>

Por um lado, é inquestionável que devemos sempre seguir o veredito evidente da consciência, ou pelo menos não o infringir com as nossas ações. Mas é muito diferente sustentar a convicção de que o ditame da consciência, ou o que consideramos como tal, sempre estaria certo, sempre seria infalível. Semelhante afirmação significaria o mesmo que dizer que não há verdade alguma, ao menos em matéria de moral e religião, isto é, justamente no âmbito que é o fundamento constitutivo da nossa existência. Como os juízos da consciência se contradizem uns aos outros, só haveria uma “verdade do sujeito” <...>.

A pergunta pela consciência nos transporta, na prática, para o domínio essencial do problema moral e a interrogação acerca da existência do homem. Não gostaria de pôr esses problemas em forma de considerações estritamente conceituais e, por conseguinte, completamente abstratas, mas preferiria avançar de modo narrativo.

Primeiramente, contarei a história da minha relação pessoal com esse problema. Ele pôs-se pela primeira vez com toda a sua urgência no começo da minha atividade acadêmica. Um meu colega mais velho <...>, expressou durante uma disputa a opinião de que devíamos dar graças a Deus por conceder a muitos homens a possibilidade de fazer-se não-crentes seguindo a sua consciência; se lhes abríssemos os olhos e eles se fizessem crentes, não seriam capazes de suportar neste nosso mundo o peso da fé e das suas obrigações morais. Mas, como todos seguiram de boa-fé um caminho diferente, poderiam alcançar a salvação.

O que mais me chocava nessa afirmação não era a idéia de uma consciência equivocada concedida pelo próprio Deus para poder salvar os homens mediante esse estratagema, isto é, a idéia de uma ofuscação enviada por Deus para a salvação de alguns. O que me perturbava era a idéia de que a fé fosse uma carga insuportável que só naturezas fortes poderiam suportar, quase um castigo ou, em todo o caso, uma exigência difícil de cumprir. A fé não facilitaria a salvação, antes a dificultaria. Livre seria aquele que não carregasse com a necessidade de crer e de dobrar-se ao jugo da moral que decorre da fé da Igreja Católica. A consciência errônea, que permitiria uma vida mais leve e mostraria um caminho mais humano, seria a verdadeira graça, o caminho normal da salvação. A falsidade e o afastamento da verdade seriam melhores para o homem do que a verdade. O homem não seria libertado pela verdade, mas deveria ser libertado dela. A morada do homem seria mais a obscuridade do que a luz, e a fé não seria um dom benéfico do bom Deus, mas uma fatalidade.

Porém, se as coisas fossem assim, como poderia surgir a alegria da fé? Como poderia surgir a coragem de transmiti-la aos demais? Não seria melhor deixá-los em paz e mantê-los distantes dela? Foram idéias como essa que paralisaram, com cada vez mais força, a tarefa evangelizadora. Quem encara a fé como uma carga pesada ou como uma exigência moral excessiva não pode convidar outras pessoas a abraçá-la. Prefere deixá-los na suposta liberdade da sua boa consciência.

<...> O que inicialmente me estarreceu no argumento mencionado era, sobretudo, a caricatura de fé que me pareceu haver nele. Mas, numa segunda consideração, pareceu-me igualmente falso o conceito de consciência que pressupunha. A consciência errônea protege o homem das exigências da verdade e o salva: assim soava o argumento. A consciência não aparecia nele como uma janela que abre para o homem o panorama da verdade comum que sustenta a cada um e a todos, tornando possível que sejamos uma comunidade de vontade e de responsabilidade apoiada na comunidade do conhecimento. Nesse argumento, a consciência também não é a abertura do homem ao fundamento que o sustenta nem a força que lhe permite perceber o supremo e essencial. Trata-se antes de uma espécie de invólucro protetor da subjetividade <...> que não dá acesso à estrada salvadora da verdade, que ou não existe ou é exigente demais; e converte-se assim em justificação da subjetividade, que não se quer ver questionada, e do conformismo social, que deve possibilitar a convivência como valor médio entre as diversas subjetividades. Desaparecem assim o dever de buscar a verdade e as dúvidas quanto às atitudes e costumes dominantes: bastariam o conhecimento adquirido individualmente e a adaptação aos outros. O homem é reduzido às convicções mais superficiais, e quanto menor a sua profundidade, melhor para ele. <...>.

Pouco depois, numa disputa entre um grupo de colegas sobre a força justificadora da consciência errônea, alguém objetou contra essa tese que, se fosse universalmente válida, estariam justificados – e deveríamos procurá-los no céu – os membros das SS que cometeram os seus crimes com um conhecimento fanatizado e plena segurança de consciência. <...> Não haveria a menor dúvida de que Hitler e os seus cúmplices, que estavam profundamente convencidos do que faziam, não podiam ter agido de outra forma. Apesar do horror objetivo das suas ações, teriam agido moralmente do ponto de vista subjetivo. Como seguiam a sua consciência, embora esta os tivesse guiado erroneamente, deveríamos reconhecer que as suas ações eram morais para eles; não poderíamos duvidar, em suma, da salvação eterna das suas almas.

A partir dessa conversa, sei com segurança absoluta que há algum erro na teoria sobre a força justificadora da consciência subjetiva; em outras palavras, que um conceito de consciência que conduz a semelhantes resultados é falso. A firme convicção subjetiva e a segurança e falta de escrúpulos que dela derivam não tiram a culpa do homem. Quase trinta anos depois, lendo o psicólogo Albert Görres, descobri resumida em poucas palavras a idéia que então tentava penosamente reduzir a conceitos e cujo desenvolvimento forma o núcleo das nossas reflexões. Görres indica que o sentimento de culpabilidade, a capacidade de sentir culpa, pertence de forma essencial ao patrimônio anímico do homem. O sentimento de culpa, que rompe a falsa tranqüilidade da consciência <...>, é um sinal tão necessário para o homem como a dor corporal, que permite conhecer a alteração das funções vitais normais. Quem não é capaz de sentir culpa está espiritualmente doente, é um “cadáver vivente, uma máscara do caráter”, como diz Görres (6). “Os animais e os monstros, entre outros, não têm sentimento de culpa. Talvez Hitler, Himmler ou Stalin também não o tenham tido. Com certeza, os chefões da máfia também carecem dele. Mas, na verdade, é bem possível que os seus cadáveres estejam ocultos no sótão, junto com os sentimentos de culpa rejeitados... Todos os homens necessitam de um sentimento de culpa” (7).

Além do mais, uma rápida olhada na Sagrada Escritura poderia ter evitado esses diagnósticos e as teorias da justificação pela consciência errônea. No Salmo 19, 13 encontramos uma proposição eternamente digna de reflexão: “Quem será capaz de reconhecer os seus deslizes? / Limpa-me <, Senhor,> dos que me são ocultos”. Isso não é um “objetivismo veterotestamentário”, mas profunda sabedoria humana: negar-se a ver a culpa ou fazer emudecer a consciência em tantos assuntos é uma doença da alma mais perigosa que a culpa reconhecida como culpa. Aquele que é incapaz de perceber que matar é pecado cai mais baixo do que aquele que reconhece a ignomínia da sua ação, pois está muito mais distante da verdade e da conversão. Não é em vão que, diante de Jesus, o orgulhoso aparece como alguém verdadeiramente perdido. O fato de o publicano, com todos os seus pecados indiscutíveis, parecer mais justo diante de Deus que o fariseu, com todas as suas obras verdadeiramente boas (Lc 18, 9-14), não significa que os pecados do publicano não sejam pecados nem que não sejam boas as obras boas. <...> O fundamento desse juízo paradoxal de Deus revela-se precisamente a partir do nosso problema: o fariseu não sabe que também tem pecados. Está inteiramente quite com a sua consciência. Mas o silêncio da consciência torna-o impermeável a Deus e aos homens, ao passo que o grito da consciência que aflora no publicano torna-o capaz da verdade e amor. Jesus pode atuar nos pecadores porque eles não se fazem inacessíveis às mudanças que Deus espera deles – de nós – escondendo-se atrás do biombo da sua consciência errônea. Mas não pode atuar nos “justos”, que não sentem necessidade nem de perdão nem de conversão; a sua consciência, que os exculpa, não acolhe nem o perdão nem a conversão.

Voltamos a encontrar a mesma idéia, ainda que exposta de outro modo, em Paulo, que nos diz que os gentios, quando guiados pela razão natural, sem Lei, cumprem os preceitos da Lei (Rom 2, 1-16). Toda a teoria da salvação pela ignorância fracassa diante desses versículos: no homem, existe a presença inegável da verdade, da verdade do Criador, que se oferece também por escrito na revelação da História Sagrada. O homem pode ver a verdade de Deus no fundo do seu ser criatural. É culpado se não a vê. Só se deixa de vê-la quando não se quer vê-la, ou seja, porque não se quer vê-la. Essa vontade negativa que impede o conhecimento é culpa. Que o farol não brilhe é conseqüência de um afastamento voluntário do olhar daquilo que não queremos ver.

A estas alturas das nossas reflexões, é possível tirar as primeiras conseqüências para responder à pergunta sobre o que é a consciência. Agora já podemos dizer: não é possível identificar a consciência humana com a autoconsciência do eu, com a certeza subjetiva de si e do seu comportamento moral. Essa consciência pode ser às vezes um mero reflexo do meio social e das opiniões nele difundidas. Outras vezes, pode estar relacionada com uma pobreza autocrítica, com não ouvir suficientemente a profundidade da alma. O que se deu no Leste Europeu após a derrocada dos sistemas marxistas confirma este diagnóstico. Os espíritos mais claros e despertos dos povos libertados falam de um imenso abandono moral, produzido por muitos anos de degradação espiritual, e de um embotamento do sentido moral, cuja perda e os perigos que acarreta pesariam ainda mais que os danos econômicos que produziu. O novo patriarca de Moscou pôs energicamente em evidência esse aspecto, no começo da sua atividade, no verão de 1990: as faculdades perceptivas dos homens que vivem num sistema de engano turvam-se inevitavelmente. A sociedade perde a capacidade de misericórdia e os sentimentos humanos desaparecem. <...> “Temos de conduzir de novo a humanidade aos valores morais eternos”, isto é, desenvolver de novo o ouvido quase extinto para escutar o conselho de Deus no coração do homem. O erro, a consciência errônea, só são cômodos num primeiro momento. Depois, o emudecimento da consciência converte-se em desumanização do mundo e em perigo mortal, se não reagimos contra eles.

Em outras palavras: a identificação da consciência com o conhecimento superficial e a redução do homem à subjetividade não libertam, mas escravizam. Fazem-nos completamente dependentes das opiniões dominantes e reduzem dia após dia o nível dessas mesmas opiniões dominantes. Aquele que iguala a consciência à convicção superficial identifica-a com uma segurança aparentemente racional, tecida de fatuidade, conformismo e negligência. A consciência degrada-se à condição de mecanismo exculpatório, em vez de representar a transparência do sujeito para refletir o divino, e, como conseqüência, degrada-se também a dignidade e a grandeza do homem. A redução da consciência à segurança subjetiva significa a supressão da verdade. Quando o salmista, antecipando a visão de Isaías sobre o pecado e a justiça, pede para libertar-se dos pecados que se nos ocultam, chama a atenção para o seguinte fato: deve-se, sem dúvida, seguir a consciência errônea, mas a supressão da verdade que a precede, e que agora se vinga, é a verdadeira culpa, que adormece o homem numa falsa segurança e por fim o deixa só num deserto inóspito (8).

FORMAR A CONSCIÊNCIA

Certamente a fé cristã vai além daquilo que a pura razão é capaz de reconhecer, mas faz parte das suas convicções fundamentais que Cristo é o Logos, quer dizer, a razão criadora de Deus da qual procede o mundo e que se reflete na nossa racionalidade. O apóstolo Paulo, que falou com tanta ênfase da novidade e da unicidade do cristianismo, destacou ao mesmo tempo que o preceito moral registrado na Sagrada Escritura coincide com aquele que “está inscrito nos nossos corações, segundo o testemunho da nossa consciência” (Rom 2, 15). É verdade que, com freqüência, esta voz do nosso coração, a consciência, é sufocada pelos ruídos secundários da nossa vida. A consciência pode, por assim dizer, tornar-se cega. Precisamos assistir às “aulas de recuperação” da fé, que volta a despertá-la, e assim torna novamente perceptível a voz do Criador em nós, suas criaturas (9).

O RESPEITO HUMANO, TRAIÇÃO DA PRÓPRIA CONSCIÊNCIA

O Juiz do mundo, que um dia voltará para nos julgar a todos nós, está ali, aniquilado, insultado e inerme diante do juiz terreno. Pilatos não é um monstro de maldade. Sabe que esse condenado é inocente, e procura um modo de libertá-lo. Mas o seu coração está dividido. E, por fim, faz prevalecer a sua posição, a si mesmo, acima do direito. Também os homens que gritam e pedem a morte de Jesus não são monstros de maldade. Muitos deles, no dia de Pentecostes, sentir-se-ão emocionados até ao fundo do coração (At 2, 37) quando Pedro lhes disser: a Jesus do Nazaré, homem acreditado por Deus junto de vós, <...>, vós o matastes, cravando-o na cruz pela mão de gente perversa (At 2, 22-23). Naquele momento, porém, sofrem a influência da multidão. Gritam porque os outros gritam e tal como os outros gritam. E assim a justiça é espezinhada pela covardia, pela pusilanimidade, pelo medo do diktat da mentalidade predominante. A voz sutil da consciência fica sufocada pelos gritos da multidão. A indecisão, o respeito humano dão força ao mal (10).

FALSAS PROMESSAS

Cristo diz: Guardai-vos dos falsos profetas que vêm a vós sob disfarce de ovelhas, mas por dentro são lobos vorazes. Pelos seus frutos os conhecereis. Parece uma advertência contra as seitas e heresias.

É uma interpretação possível. Mas também é uma advertência contra qualquer regra fácil. Jesus nos previne contra os “curandeiros do espírito”. Diz que a nossa norma deve ser perguntarmo-nos: “Como vive essa pessoa? Quem é na realidade? Que frutos produzem ele e o seu círculo? Analise isso e verá a que conduz”.

Essa norma prática, ditada por Cristo à vista do momento em que viveu, projeta-se sobre a História. Pensemos nos pregadores da salvação do século passado, quer se trate de Hitler ou dos pregadores marxistas; todos vieram e disseram: “Trazemos a justiça para vós”. No princípio, pareciam mansas ovelhas, mas acabaram sendo grandes destruidores. Mas também diz respeito aos numerosos pequenos pregadores que nos dizem: “Eu tenho a chave, age assim e em pouco tempo conseguirás a felicidade, a riqueza, o êxito”.

William Shakespeare, evidentemente um católico, viveu com intensidade a roda da existência. Como bom pedagogo, no fim ofereceu uma recomendação, algo assim como a essência do seu conhecimento mundano: “Compra tempo divino, vende horas do triste tempo terrenal”. São palavras sábias, como as que se esperam de um grande homem. O tempo mais bem aproveitado é o que se transforma em algo duradouro: é o tempo que recebemos de Deus e a Ele devolvemos. O tempo que é pura transição desmorona e se transforma em mera caducidade (11).

A REGRA DE OURO

O Sermão da Montanha não corresponde necessariamente às idéias tradicionais. Opõe-se até às nossas definições de sorte, grandeza, poder, êxito ou justiça. E, no seu final, oferece ao seu público um resumo, quase que uma lei das leis, a “regra de ouro” da vida. Diz assim: “Portanto, tudo o que quiserdes que os homens vos façam, fazei-o também vós a eles; porque esta é a Lei e os Profetas”.

A regra de ouro já existia antes de Cristo, embora formulada de maneira negativa: “Não faças a ninguém o que não queres que te façam”. Jesus a supera com uma formulação positiva que, como é lógico, é muito mais exigente.

Na minha opinião, o que é grandioso é que já não se volta a comparar quem fez o que, quando, como, a quem; que a pessoa já não se perde em diferenciações, mas compreende a missão essencial que nos foi confiada: abrir bem os olhos, abrir o coração e encontrar as possibilidades criativas do bem. Já não se trata de perguntar que é o que eu quero, mas de trasladar para os outros o meu desejo. E esta entrega autêntica, com toda a sua fantasia criativa, com todas as possibilidades que abre diante de nós, está recolhida numa regra muito prática, para que não fique reduzida a um sonho idealista qualquer (12).

VIVER AS VIRTUDES

Creio que todo o mundo gostaria de saber como levar uma vida correta, <...>, como levá-la ao cume sentindo-se à vontade consigo mesmo. Antes de morrer, o grande ator Cary Grant deixou à sua filha Jennifer uma carta de despedida comovente. Quis dar-lhe nela algumas recomendações adicionais para o caminho. “Queridíssima Jennifer”, escreveu, “viva a sua vida plenamente, sem egoísmo. Seja comedida, respeite o esforço dos outros. Esforce-se para conseguir o melhor e o bom gosto. Mantenha puro o juízo e limpa a conduta”. E prosseguia: “Dê graças a Deus pelos rostos das pessoas boas e pelo doce amor que há por trás dos seus olhos... Pelas flores que ondulam ao vento... Um breve sono e despertarei para a eternidade. Se não despertar como nós o entendemos, então continuarei a viver em você, filha queridíssima”.

De certa forma, soa a católico. Seja como for, é uma carta belíssima. Se era católico ou não, não sei, mas certamente é a expressão de uma pessoa que se tornou sábia e compreendeu o significado do bem, e tenta transmiti-lo, além disso, com uma assombrosa amabilidade (13).
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NOTAS:

(1) Fe, verdad y cultura. Reflexiones a propósito de la encíclica Fides et ratio, Primeiro Congresso Internacional da Faculdade San Dámaso de Teologia, Madrid, 16.02.00.
(2) Letter to Norfolk, pág. 261.
(3) Do conhecido poema Lead, kindly light.
(4) Correspondence of J. H. Newman with J. Keble and Others, págs. 351 e 364.
(5) Verdad, valores, poder, págs. 56-64.
(6) A. Görres, “Schuld und Schuldgefühle”, em Internationale katolische Zeitschrift “Communio”, 13 (1948), pág. 434.
(7) Ibid., pág. 142.
(8) “Se quiseres a paz, respeita a consciência de cada um (Consciência e verdade)”, em Wahrheit, Werte, Macht. Prüfsteine der pluralistischen Gesellschaft, Herder, Friburgo, 1993; trad. esp. Verdad, valores, poder. Piedras de toque de la sociedad pluralista, Rialp, Madrid, 2000, págs. 40-55.
(9) Entrevista a Jaime Antúnez Aldunate.
(10) Via-sacra no Coliseu, Primeira estação: meditação, Departamento para as Celebrações Litúrgicas do Sumo Pontífice, Roma, 14.04.05.
(11) La fe, de tejas abajo.
(12) La fe, de tejas abajo.
(13) La fe, de tejas abajo. 
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Por Joseph Ratzinger 

Fux pensa que o povo É BURRO!

Na verdade, ele não pensa... quer é DAR O GOLPE!  Estejam certos, daqui para frente será assim. Eles decidirão tudo por conta, e nós ficaremos sabendo beeeem depois! Já não foi assim com o caso da Ficha Limpa? Num dia qualquer, enquanto dormíamos, eles mudaram tudo e pronto. Ficamos sabendo dias depois. A vontade do povo - que é soberana - foi esquecida.  Pois é.
Assim será com o desarmamento. Vê lá se eles desarmam o MST! Claro que não. Vê lá se desarmam as FARC. Claro que não. Querem desarmar a nós. Por quê? Porque querem o nosso bem? Será que há algum ingênuo que ainda acredita nisso? Ora, é óbvio, é lógico que querem nos subjugar.
Aos poucos, a cortina vai se abrindo...  E viva a Dilma!
Raquel Nascimento Pereira
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Ao G1, ministro do STF defende 'solução legislativa, sem plebiscito'. Para ele, 'povo votou errado' em 2005 ao manter comércio de armas.

Débora Santos Do G1, em Brasília
O ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux durante entrevista ao G1 (Foto: Débora Santos/G1)
O ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux
durante entrevista ao G1 (Foto: Débora Santos/G1)

O mais novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, disse em entrevista ao G1 que não deve ser feita nova consulta popular sobre  desarmamento em razão da tragédia de Realengo, no Rio de Janeiro. Defensor do desarmamento, ele avalia que o "povo votou errado" ao manter, no referendo de 2005, o comércio de armas de fogo.

A proposta de novo plebiscito foi apresentada nesta semana pelo presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Segundo ele, o "novo contexto" após a tragédia justifica repetir a consulta. A pergunta que Sarney propõe para o novo plebiscito é a mesma de 2005: "O comércio de armas de fogo e munição deve ser proibido no Brasil?"

Para Fux, que assumiu o posto de ministro do STF em março por indicação da presidente Dilma Rousseff, o desarmamento é "fundamental", mas, para isso, não é necessário plebiscito e sim aplicar a lei e se estabelecer uma política pública de recolhimento de armas.

"Não [se] entra na casa das pessoas para ver se tem dengue? Tem que ter uma maneira de entrar na casa das pessoas para desarmar a população", afirmou nesta quinta (14) ao G1.

Na entrevista, o ministro também disse que considerou "lamentável" a crítica que sofreu de setores da sociedade por ter votado contra a validade da Lei da Ficha Limpa na eleição de 2010. Com o voto dele, o julgamento no STF terminou com seis votos contra e cinco a favor da aplicação da lei no ano passado.
"Eu achei lamentável ter que passar por isso em razão da desinformação. Não vou negar que eu acusei o golpe", declarou.

Leia abaixo os principais trechos da entrevista.

G1 - Quase dois meses depois de empossado, como o sr. se sente na posição de ministro do STF? Como lida com pressões sociais e de outros poderes?
Luiz Fux -
Depois de uma semana e meia, já [se] é ministro há muitos anos. O volume é tão grande que você aprende no tranco. Eu tenho me sentido muito à vontade no Supremo.  Salvante os princípios-regra, [no Supremo] é um julgamento de valoração de interesses, de ponderação de valores éticos e que conferem legitimidade social à solução. No caso da união homoafetiva, você tem que sopesar o valor da família, a liberdade sexual, o princípio da não discriminação. Sobre feto anencéfalo, eu li um artigo e até guardei. Essa escritora usou uma expressão forte: será que uma mãe é obrigada a ficar realizando o funeral do seu filho durante nove meses? Eu acho que isso deveria ser uma questão plebiscitária feminina. As mulheres tinham que decidir. É um consectário [resultado] do estado democrático de direito. Não podemos julgar à luz da religião, porque o estado é laico.
O ministro Luiz Fux na cerimônia de posse no Supremo Tribunal Federal, no dia 3 de março (Foto: José Cruz/ABr) 
Fux na cerimônia de posse no Supremo Tribunal Federal, no dia 3 de março (Foto: José Cruz/ABr)
G1 - Como o sr. viu a tragédia de Realengo, que antes era um tipo de crime muito comum em outros países, mas inédito no Brasil?
Fux -
Nos Estados Unidos, tem o monitoramento de pessoas potencialmente perigosas. Hoje, com esse acesso à internet, a esses sites de redes terroristas, pessoas desequilibradas têm acesso a informações que exacerbam seu desequilíbrio. Olha essas fitas que antecederam a essa tragédia, onde esse sujeito gravou isso? É um sujeito que não podia estar solto nunca. Tinha que ter uma medida restritiva de liberdade. Será que ninguém viu isso? Porque não acharam antes isso? Esse homem não tinha um pendor para aquilo? Será que ninguém teve oportunidade de denunciar isso? É um problema que interessa à família e ao Estado também. A causa disso é o acesso que esse rapaz teve a essas redes internacionais que alimentam uma série de psicopatias. Nessa rede mundial de computadores, você tem acesso a tudo. A polícia tinha que ter, por exemplo, uma comunicação de que um sujeito acessou o site da Al Qaeda. Esse sujeito tem alguma coisa. Agora, o leite está derramado.

G1 - Para o sr., o massacre de Realengo é um motivo suficientemente forte para ensejar uma nova consulta à população?
Fux - Eu acho que tinha que vir uma solução legislativa, sem plebiscito mesmo. Todo mundo sabe que o desarmamento é fundamental.

G1 - Mas em 2005 a maioria da população decidiu manter o livre comércio de armas.
Fux -
É um exemplo de defesa do povo contra o povo. Eu acho que o povo votou errado. Para que serve você se armar? Quando você se arma, pressupõe que se vive num ambiente beligerante. Muito melhor é uma sociedade solidária, harmônica. Eu acho que os políticos têm que avaliar o clima de insegurança do país. E já há o Estatuto do Desarmamento. Tem que fazer valer a lei, implementar políticas públicas no afã de desarmar a população. Não tem que consultar mais nada. O Brasil é um país que tem uma violência manifesta. Tem que aplicar essa lei e ter política pública de recolhimento de armas. Não [se] entra na casa das pessoas para ver se tem dengue? Tem que ter uma maneira de entrar na casa das pessoas para desarmar a população.

G1 - O sr. tem porte de arma? Já teve arma em casa?
Fux -
A arma na mão de uma pessoa que tem seus instintos, fraquezas, ela vai reagir. Depois a pessoa cai em si e vê que tirou uma vida e vai sofrer para o resto da vida. São posturas que a gente tem que evitar ao invés de reprimir. Melhor do que reprimir o porte de arma, é evitar o porte de arma. [Como magistrado], eu sempre tive o porte de arma, mas nunca andei armado. Era importante ter o porte de arma, porque a gente ia sozinho para comarca do interior, não tinha cultura de segurança, mas eu não ia armado. Eu entendo que o povo tem que estar absolutamente desarmado. Se esse sujeito não tivesse acesso a arma e carregadores, quando muito ele entraria ali com uma faca, ia tentar matar um e todos iam correr para tentar evitar aquela tragédia.

G1 - Como o sr. avalia as reações e críticas ao seu voto contra a validade da ficha limpa na eleição de 2010? [quando estava com um ministro a menos, o STF analisou a aplicação da Lei da Ficha Limpa na eleição de 2010, e o julgamento terminou empatado em cinco votos a favor e cinco contra. Com a nomeação de Fux como ministro, em março, o julgamento teve continuidade e ele desempatou]
Fux - Eu confesso que a Justiça não é uma função popular. Eu achei lamentável ter que passar por isso em razão da desinformação. Não vou negar que eu acusei o golpe. Eu sempre fui uma pessoa que segui a vida com retidão. Vim para o Supremo Tribunal Federal, passei por uma sabatina de cinco horas, tenho currículo. Não tinha necessidade de passar por uma crítica imoderada e talvez desinformada. Como ser humano, não fiquei à vontade, fiquei aborrecido, principalmente, com alguns segmentos que tinham o dever de saber que tinha uma regra, na Constituição, explícita [a de que uma lei que muda o processo eleitoral não pode entrar em vigor no mesmo ano da eleição.]. Eu confesso a você que eu tentei, eu era ideologicamente favorável à Lei da Ficha Limpa. Mas essa regra da Constituição é tão clara que o precedente que se abriria com ela poderia mais tarde se voltar contra o próprio povo. 

G1 - Quando terminou de elaborar seu voto, o sr. pensou na reação das pessoas ao resultado do julgamento?
Fux -
Eu não fui lá com o compromisso de ter que ser o salvador da Pátria, de cair nos braços do povo. Eu não faço esse gênero. Seria demais que eu tivesse um voto tão qualificado assim para desempatar. Acho que essa expectativa que se criou se deve muito mais ao fato de ter ficado muito tempo sem ministro e, normalmente, essas questões teriam que ter sido desempatadas com o voto de qualidade do presidente, pela emenda regimental. Eu reconheço que assumi num momento muito delicado. Mas você há de convir que eu não poderia levar isso em consideração a ponto de me amesquinhar como magistrado.

G1 - O Supremo condenou no ano passado o primeiro parlamentar, desde a Constituição de 1988. Como o sr. avalia as críticas de que a Corte facilitaria a vida de réus de colarinho branco?
Fux -
Seria de bom alvitre se tivesse um mutirão para julgar essas questões penais para apagar essa imagem junto a população. Agora, o Supremo não julga com benevolência. A lei estabelece tantas etapas que, até que o juiz consiga superar todas elas, obedecendo ao devido processo legal, os prazos se escoam, as testemunhas desaparecem. Então, você vai julgar 10, 15 anos depois. Eu cheguei ao STF e já encontrei ações penais iniciadas em 2003. Aí, eu dei um despacho e determinei que se elaborasse o relatório para acabar com aquilo. Disseram: ‘Não posso, ainda faltam quatro testemunhas’. Não pode, estamos em 2011. E nós não podemos fazer a prova. O juiz não pode ser um órgão acusador.

G1 - Diante da demora nos julgamentos e dos entraves do Judiciário, como o sr. avalia a proposta do presidente do STF, ministro Cezar Peluso, de limitar a possibilidade de recurso depois que o processo é julgado pela segunda instância (tribunais de Justiça dos estados)?
Fux - Eu antevejo problemas de assimilação política dessa ideia. Em termos técnicos, estou analisando essa questão. Ela tem uma virtude que é permitir que a decisão transite em julgado antes do que vem ocorrendo hoje. Se a decisão transita em julgado, resolve alguns problemas pontuais. Como, por exemplo: só se considera culpada uma pessoa depois do trânsito em julgado [quando se esgotam as possibilidades de recurso]. Acaba com essa cultura de se buscar sempre a liberdade no STF a pretexto de dizer que a sentença ainda não transitou em julgado. Isso gera distorções na vida cotidiana porque está havendo um uso imoderado do habeas corpus [instrumento que garante a liberdade de alguém que corre o risco de ser preso ilegalmente ou por abuso de poder] por conta disso. [...] É um excesso que impede que você  [o ministro do Supremo] possa se dedicar mais a outras matérias. Hoje tem habeas corpus para tudo, até o que não é matéria de habeas corpus. [...] De qualquer maneira, precisa de um instrumento de gestão porque essa realidade tem que ser enfrentada. [...] Hoje o trabalho no Supremo é irracional. É muito trabalho.
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