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sexta-feira, 24 de maio de 2013

O Intruso

O demônio ronda a sua casa. Fica andando pelos jardins, espreitando entre portas e janelas. Ele quer um lugar para morar, e escolhe o conforto da sua casa. Seus filhos percebem os movimentos dele e comentam sobre ele com você, e então você explica para eles quem ele é e o que quer. Eles ficam com medo, mas confiam em você, e ajudam para que você o expulse dali para bem longe.

Ele vai, fica algum tempo afastado, mas volta, agora com aparência mais elegante e discreta. E então, passa a abordar seus filhos na escola, no trabalho, nas ruas... fazendo-lhes promessas, dizendo-lhes que, se abrirem a porta da casa para ele, poderá fazer muito mais do que você faz. Promete-lhes, inclusive, maravilhosos brinquedos, dinheiro sem trabalho, muitas distrações e até um alvará para que possam sair à noite fazer o que quiserem, sem que ninguém os condene.

Num belo dia – naqueles dias em que você está envolvido com o trabalho e o sustento de sua família – seus filhos autorizam a entrada do demônio na sua casa. Ele entra e logo de cara promove uma festa. Compra bebidas, drogas, traz mulheres de bordéis e muita diversão para seus filhos. Quando você chega e vê a confusão instalada na sua casa, chama-o e ameaça colocá-lo para fora. Mas seus filhos estão do lado dele. Ele já os seduziu com mulheres, muitos presentes, comidas gostosas fora de hora, programas proibidos... e seus filhos adoraram toda essa permissividade: “- Agora sim, a verdadeira felicidade mora conosco!”, dizem. E o demônio escarnece de você. De agora em diante, você percebe que o intruso é você.

Tem início uma temporada de dias difíceis. O demônio tomou posse da sua casa e, além disso, trouxe consigo alguns amigos. É uma desordem total. Discussões todos os dias: um dia são revistas pornográficas espalhadas pela casa; outro dia é o seu cartão de crédito que estoura; outro dia é aquela festa dos amigos de seus filhos, regada a bebidas e drogas, e tudo aquilo que você construiu durante tantos anos parece desmoronar em pouco tempo. Seus filhos ficam rebeldes e já não o atendem mais. A sua vida torna-se um inferno.
Então, seus filhos olham para você e dizem: “Nós todos estamos de acordo com o que ele diz e faz, nunca vivemos dias tão alegres. Você não nos deixava viver. Vivia nos proibindo isso e aquilo. Agora sim é que a nossa vida está boa, e se você não está gostando, saia!”, - e colocam você para fora da sua própria casa.

Você sai e procura apoio na Justiça. Chegando lá, os juízes dizem a você que seus filhos têm razão, e que você está cometendo crimes se não deixá-los livres para fazerem o que bem quiserem.  Você não se contenta com a resposta e procura seus filhos, tenta persuadi-los falando-lhes sobre o amor, sobre a paz, sobre como eram felizes quando estavam unidos... mas eles não querem  mais saber de você. Dizem que você é um velho, que você vive no passado e que você precisa rever seus valores.

Então você vira-lhes as costas e sai, e deixa que a casa caia por si. Um dia você voltará para juntar os caquinhos do que sobrou e reconstruir peça por peça, sabendo que nunca mais a sua casa será a mesma, será sempre uma casa reconstruída, reformada. Uma casa que um dia foi invadida, depravada e destruída em seus valores, mas que um dia - não se sabe quando - ganhará uma nova cor, pelo pincel das suas mãos.

Das coisas velhas, faz-se o novo, como aquele homem que "tira do baú coisas novas e velhas."

(Qualquer semelhança é mera coincidência.)
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